domingo, 1 de julho de 2012

Sem pista duplicada, BR-381 tem 52,5% mais mortes

Rodovia da morte
Neste ano, foram 40 óbitos de BH a São Paulo contra 61 no sentido Vitória
Publicado no Jornal OTEMPO em 01/07/2012

LUCIENE CÂMARA
Enviada especial
FOTO: FOTOS ANGELO PETTINATI
Mortes. Cruz na rodovia indica que trecho já foi cenário de tragédia
João Monlevade, Ipatinga e Nova Era. A fama de rodovia da morte não é à toa. Só nos primeiros cinco meses deste ano, 61 pessoas perderam a vida na BR-381, no trecho de 314 km entre Belo Horizonte e Governador Valadares, de acordo com dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Isso sem contar as vítimas que morrem horas depois dos acidentes, nos hospitais, e que não entram nas estatísticas. O percurso de pista simples e sinuoso mata 52,5% mais do que a parte duplicada e privatizada da rodovia, com 463 km, chamada de Fernão Dias, entre as capitais mineira e paulista. Nesse trecho, 40 morreram no mesmo período deste ano.
A promessa do governo federal é lançar, até setembro, o edital de licitação da tão esperada duplicação da rodovia da morte. Mas enquanto a obra não sai do papel, o perigo continua a fazer parte da vida de milhares de pessoas que passam pelo trajeto ou moram nas cerca de 30 cidades às margens da estrada. A PRF estima que 20 mil veículos trafeguem pelo trecho que deverá ser duplicado em dias comuns, entre carros de passeio e muitos, muitos caminhões, carretas e bitrens, que atendem, em sua maioria, às mineradoras e siderúrgicas da região com materiais pesados.
Só no trecho de serra de cerca de 100 km, entre Belo Horizonte e João Monlevade, considerado o mais perigoso, há algo entorno de 200 curvas. O asfalto é tomado por marcas de pneus deixadas pelos caminhões, que acabam tombando no trecho. De janeiro a maio deste ano, foram 1.063 acidentes nesse percurso, uma média de sete por dia. E nem os inúmeros radares espalhados pela estrada freiam o perigo, já que, nos primeiros cinco meses de 2011, o índice de acidentes foi quase idêntico ao de 2012, com 1.064 casos.
O Hospital Margarida, o maior de João Monlevade, recebe, em média, cem acidentados por mês, todos vítimas de ocorrências na BR-381.
A reportagem do jornal O TEMPO passou três dias percorrendo o trecho de 314 km e se deparou com a realidade de quem é obrigado a conviver com o medo, os traumas e as perdas. É o caso da dona de casa Janice Galo Faustino, 55, que perdeu o marido há seis anos em um acidente na rodovia. José Maria tinha 55 anos quando foi atingido por um carro no acostamento. "Toda vez que olho para a 381, lembro dele", diz a viúva. Moradora de Nova Era, na região Central, ela avista a rodovia do portão de casa.
Ali perto, outra história trágica. A dona de um restaurante à margem da 381, que preferiu se identificar apenas como Aparecida, 48, perdeu o pai, o irmão e o cunhado em acidentes na mesma estrada. "Meu pai faleceu há 20 anos, acreditando que a duplicação estava prestes a acontecer".
Entre tantas tragédias, há também relatos de sobreviventes, como o do vendedor Railson Rodrigues dos Santos, 41, que ficou 33 dias em coma e 13 sem memória, em 2008. "Perdi o controle do carro em uma curva da 381 e cai na ferrovia, onde fui prensado por um trem".
Tarcila Prandini (de calça azul escuro) já se acidentou no trabalho
Riscos
Até socorristas sofrem com os perigos da 381
Quem salva vidas na BR–381 também convive com o risco iminente de acidentes. A socorrista do Serviço Voluntário de Resgate (Sevor), Tarcila Prandini de Oliveira, 30, capotou uma ambulância em 2010 ao prestar atendimento no trecho próximo a João Monlevade. "Era uma manhã chuvosa de domingo, pós-feriado de Natal, e havia três acidentes ao mesmo tempo, a poucos metros de distância um do outro", lembra.
No caminho para o socorro, o carro de Tarcila deslizou na pista e caiu em uma ribanceira. "Havia muito óleo na via". O veículo teve perda total e Tarcila sobreviveu apenas com arranhões e dores na cabeça. "Hoje, tenho consciência do perigo que é a 381", conta.
Ela é uma entre os 55 socorristas do Sevor, grupo voluntário criado há 13 anos. Apesar do alto índice de acidentes na BR–381, João Monlevade não tem Corpo de Bombeiros nem Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). A equipe atua 24 horas e atende em média cem ocorrências por mês. (LC)

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