Movimento pela saída do então presidente Fernando Collor do poder, acusado de corrupção, levou milhares de brasileiros às ruas vestidos de preto e com os rostos em verde e amarelo
UAI - Movimento pela saída do então presidente Fernando Collor do poder, acusado de corrupção, levou milhares de brasileiros às ruas
Agosto
de 1992. Há 20 anos, em meio a uma turbulenta crise política, o então
presidente Fernando Collor de Mello convocou os brasileiros para que
saíssem às ruas vestidos de verde e amarelo. Queria mostrar que tinha a
simpatia do povo. Primeiro presidente eleito depois de 25 anos de regime
militar, ele se viu pressionado por manifestações populares e por uma
comissão parlamentar de inquérito (CPI) que investigava um esquema de
corrupção em seu governo. As denúncias, feitas inicialmente por Pedro
Collor, irmão do presidente, apontavam o tesoureiro de campanha Paulo
César Farias como operador de contas bancárias em paraísos fiscais.
Diante disso, cerca de 10 mil pessoas se manifestaram em frente ao Museu
de Arte de São Paulo (Masp) em 11 de agosto, liderados pelo então
sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva e pelo presidente da União
Nacional dos Estudantes (UNE), Lindberg Farias, hoje senador pelo Rio de
Janeiro.
Dois
dias depois, Collor fez um pronunciamento para a nação. Era uma
quinta-feira e ele pedia que os brasileiros trajassem as cores da
bandeira nacional no domingo seguinte. Mas o resultado foi um forte
revés. Já no dia 14, milhares tomaram a Candelária, no Rio de Janeiro,
dando uma pista do que aconteceria no fim de semana. No tão esperado
domingo, 16 de agosto, brasileiros de todas as partes do país saíram as
ruas, mas vestiam roupas pretas, tinham os rostos pintados de verde e
amarelo e pediam a saída do presidente. Eram os caras-pintadas, na data
que entrou para a história como o Domingo Negro. Em Belo Horizonte,
manifestantes tomaram a Avenida Afonso Pena, no Centro, e ocuparam a
Praça Sete, entoando palavras de ordem contra o governo Collor. Os
maiores protestos ocorreram em São Paulo, Rio e Brasília.
Zito
Vieira, que foi secretário de Esporte e Lazer da atual gestão da
Prefeitura de Belo Horizonte, era então um jovem, diretor da União
Estadual dos Estudantes (UEE-MG). Ele conta que ajudou a organizar
manifestações do movimento Fora Collor e lembra que não só estudantes,
mas também adultos, idosos e até crianças participavam dos atos, que
eram muito espontâneos e contavam com a colaboração de diversas
entidades e voluntários para a mobilização da população. “Os atos foram
aumentando cada vez mais”, relembra.
A
jovem Maíra Gomes, à época com 12 anos, estudava no Colégio Padre
Machado, na Região da Savassi, e não conhecia a Praça Sete, tampouco
acompanhava as novidades da CPI que investigava o governo Collor. Quando
um carro de som do Sindicato dos Metalúrgicos de Belo Horizonte e
Contagem passou em frente ao seu colégio chamando os estudantes para
participarem da passeata, a jovem resolveu pular o muro e acompanhar o
comboio. “Eu nunca tinha ido à Praça Sete. Muitos colegas foram comigo”,
relembra. Ela conta que depois da terceira manifestação de que
participou passou a entender o que estava acontecendo e posteriormente
se envolveu com a militância política. “O Fora Collor foi marcante.
Depois passei a integrar o grêmio da escola e a Ubes (União Brasileira
dos Estudantes Secundaristas)”, afirma.
Maíra
lembra que participava das passeatas sem que seus pais soubessem, pois
eles temiam que houvesse repressão violenta. “Eles participaram da
invasão da Fafich (Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG) no
final da década de 60, então eu ia escondida”, conta. Ela se formou em
direito e seguiu trabalhando no campo sindical. Anos depois, por acaso,
foi contratada para defender o mesmo sindicato que a levou a pular o
muro da escola e ser uma cara-pintada: o dos metalúrgicos. Lembrando do
passado, ela avalia que houve um grande ganho com as manifestações e que
frutos ainda são colhidos até hoje, principalmente a consolidação da
democracia.
INFLUÊNCIA
Um dos expoentes políticos do movimento dos caras-pintadas foi
Alexandre Padilha, hoje ministro da Saúde, à época diretor da UNE e
estudante de medicina da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Ele ressalta o grande protagonismo que a juventude teve naquele ano e
avalia: “Mostramos, da nossa forma, que as passeatas estudantis poderiam
influenciar a política no país”. Ele conta que o sentimento dos
estudantes era de muita felicidade, pois o país estava ouvindo o que
tinham a dizer.
Manifestações do Fora Collor duraram até a saída do presidente, em dezembro de 92, e ocorreram em várias partes do país
Padilha
diz ter absoluta convicção do saldo histórico que o movimento do
impeachment trouxe e opina: “Reforçamos o debate sobre termos cada vez
mais no país instituições que valorizem a democracia”. Ele acredita que o
processo foi uma marca na construção do Brasil atual, por ter feito seu
primeiro presidente eleito por voto popular depois da ditadura passar
por um processo de impedimento pacífico, democrático e com regularidade
institucional.
LINHA DO TEMPO
1989 – Fernando Collor vence a eleição para a Presidência da República no segundo turno contra Lula
15/3/1990 – Collor assume a presidência
5/1992
– Pedro Collor denuncia o irmão por esquema de corrupção com PC Farias.
No mesmo mês, a mãe deles acusa Pedro de insanidade mental e o
presidente desmente as acusações
1/6/1992
– CPI é instalada. Pedro e PC Farias depõem. No mês seguinte, um cheque
para pagamento de uma Elba de Rosane Collor liga o presidente a PC
Farias
11/8/1992 – Mais de 10 mil pessoas fazem manifestação no Centro de São Paulo contra o presidente
13/8/1992 – Fernando Collor faz pronunciamento pedindo que cidadãos vistam as cores do Brasil e saiam às ruas em sua defesa
16/8/1992
– Brasileiros se vestem de preto, pintam os rostos de verde e amarelo e
fazem passeatas por todo o Brasil pedindo a saída do presidente do
poder
29/9/1992 –Câmara dos Deputados vota a favor do processo de impeachment
2/10/1992 – Ele é afastado da presidência e seu vice Itamar Franco assume
29/12/1992 –Collor renuncia, mas Senado caça seus direitos políticos por oito anos
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