sábado, 18 de agosto de 2012

População protesta por segurança na capital - Abandonados pelo poder público

Moradores recorrem a faixas e cartazes para chamar atenção da violência. Polícia diz que tática não funciona
Paula Sarapu
Tiago de Holanda - Estado de Minas
Publicação: 18/08/2012 07:10 Atualização: 18/08/2012 07:15
Ilustração: http://www.diariodeumpm.net/2006/07/27/violencia-a-culpa-e-da-policia/ 


O aposentado Márcio Rocha em frente à loja onde houve crime no Belvedere. "O bairro é visado"
O aposentado Márcio Rocha em frente à loja onde houve crime no Belvedere. 'O bairro é visado'
Em 40 minutos, dois carros roubados na porta de casa. Foi o bastante para o empresário Antônio de Souza e Silva, de 58 anos, se unir a uma corrente de moradores do Padre Eustáquio, na Região Noroeste de Belo Horizonte, que se cansou da sucessão de crimes no bairro e resolveu protestar por segurança. O grupo, que diz se sentir abandonado, encomendou faixas e planeja espalhá-las por vários pontos da região para alertar contra assaltos, arrombamentos, roubo de carros e tentativa de invasão de residências. A estratégia de chamar a atenção da polícia se repete em outros bairros e já divide opiniões entre associações de moradores da capital. “A sensação é de abandono”, justifica Antônio.
O empresário foi assaltado em 10 de julho. Chegou em casa por volta das 18h e, como sairia logo em seguida, deixou o carro na Rua Francisco Bicalho. Quando saiu para ir a uma reunião na escola do neto, não viu mais seu Fiat Strada. Antônio resolveu procurar a picape com outro carro, um Vectra, e achou o veículo, que tinha dispositivo antirroubo, a três quarteirões de casa. Mas ele não teve tempo para comemorar: ao voltar para casa no Vectra, o empresário foi rendido por dois homens armados. “Encostaram a arma no meu ouvido e levaram documentos, o carro e o celular”, lembra. “Eram 7h40 da noite e a PM nem sequer tinha aparecido para registrar o primeiro roubo”, completa.
No Padre Eustáquio, moradores dizem que roubos de carros e arrombamentos são frequentes, o que motivou a encomenda das faixas para protestar. O empresário Antônio Silva diz que, na rua dele, outros três carros foram roubados desde então. “Na semana passada, uma picape foi arrombada”, afirma. No muro da frente da casa do empresário, o suporte em que funcionava uma câmera de segurança está vazio. O equipamento, conta, foi furtado 15 dias após ser instalado. “Botei outra e, três dias depois, levaram de novo”, indigna-se. “Precisamos dar um basta.”
A dona de casa Larissa Alves Martins, de 38 anos, também teve o carro levado e aprova a instalação das faixas, o que deve ocorrer na próxima semana. Segundo a Delegacia Especializada em Investigação de Furto e Roubo de Veículos Automotores de Belo Horizonte, a Região Noroeste é a segunda colocada no ranking, com 1.363 casos entre janeiro e dezembro de 2011. A Região de Venda Nova lidera as estatísticas, com 1.437 ocorrências nesse período. “Estamos cansados de chamar a polícia, fazer o boletim de ocorrência e não perceber uma intervenção maior”, diz Larissa. “A ideia das faixas é chamar a atenção”, acrescenta.
Cartazes A tática também é adotada no Bairro Cruzeiro, na Região Centro-Sul. Moradores espalharam cartazes na Rua da Prata, com um aviso aos motoristas: “Não estacione nesta rua. Alto índice de assaltos”. O problema é antigo, segundo o engenheiro civil Moacyr Urban, 50 anos. Há cerca de oito anos, ele deixou seu Saveiro parado na frente de casa e, ao sair, não viu mais o veículo. Desde então, os bandidos fizeram outras investidas. “Aparelhos de som (de carro), já me roubaram três. Outra vez, quebraram o vidro (da janela) para levar uma jaqueta de frio”, relata. “Toda semana você vê carros com vidros quebrados”, reforça.
Os bandidos agem à luz do dia e sem constrangimento, segundo o empreiteiro Vandir Lopes, de 29 anos, que há dois trabalha na construção de um edifício na Rua da Prata. “Aqui é tão parado. Descem direto pessoas olhando para dentro dos carros, para ver o que tem lá. Na cara dura”, ressalta. Ele sempre estaciona seu carro em frente à obra e conta que, “há uns três meses”, os retrovisores do veículos foram roubados duas vezes.
Sem consenso A estratégia de chamar a atenção da polícia com faixas e cartazes divide moradores. Para o presidente da Associação de Moradores do Bairro Anchieta, Saulo Lages, iniciativas deste tipo podem fragilizar ainda mais a região. “Se você expõe um problema dessa forma, dizendo que não tem polícia e que o bairro está abandonado, acaba trazendo mais bandidos”, considera.
Alvo dos protestos, a Polícia Militar também desaprova as faixas. “O cidadão às vezes desconhece o trabalho que já existe, os limites de policiamento e até da própria lei. É preciso conhecer a estrutura para criticar e apoiar”, diz o comandante de Policiamento da Capital, coronel Rogério Andrade. “Quando o infrator percebe o descrédito da população com medidas de indignação como essas, o lugar se torna mais vulnerável”, justifica.
No Belvedere, Região Centro-Sul da cidade, onde há oito dias o empresário César de Moura Gomes foi baleado na cabeça durante tentativa de assalto à sua loja, a associação de moradores não tem planos de protestar com faixas e cartazes, mas a comunidade pretende se reunir com o Comando de Policiamento da Capital na quarta-feira. Desde o crime, no dia 10, o bairro está mais deserto, principalmente à noite, segundo o presidente da Associação dos Amigos do Bairro Belvedere, Ubirajara Pires Glória. Ele conta que o policiamento está reforçado, mas diz que os corredores e pessoas que caminhavam no entorno da Lagoa Seca estão evitando o lugar.
Os moradores relatam casos frequentes de invasões a residências, roubos de carros e ataques aos esportistas, que perdem tênis, relógios e equipamentos de música. Segundo as associações, há uma média de 70 casos por mês. “Assalto a pedestre é constante. É um bairro muito visado”, relata o professor aposentado Márcio Rocha, de 73 anos, vizinho da loja em que César Gomes foi baleado, em cuja fachada foi posta um cartaz com a palavra “paz”.
Promessa de ponto de apoio nos bairros
A Polícia Militar anunciou ontem que vai criar um ponto fixo de policiamento em cada bairro, a partir de novembro. A medida integra um novo modelo de ações que, segundo a PM, visa estreitar os laços com a comunidade. Bairros mais extensos poderão ter até duas bases para a patrulha, que terá um espaço demarcado no chão, em local de grande movimento. O acerto foi feito em reunião entre o comandante de Policiamento da Capital, coronel Rogério Andrade, a BHTrans e a Secretaria Municipal de Regulação Urbana.
Segundo o comandante, os locais serão estratégicos para o policiamento preventivo, com grande circulação de pessoas. Cada ponto será definido a partir da sugestão dos moradores, em reuniões com os Conselhos Comunitários de Segurança de cada bairro. O comandante informou ainda que vai criar um e-mail para cada bairro, que servirá também como canal de comunicação. "Essa iniciativa dará visibilidade ao policiamento, permitindo que o cidadão conheça o trabalho da polícia. Para chegar até a base e sair de lá, a viatura fará a avaliação do entorno e servirá como referência para os moradores. É mais um complemento à Patrulha do Bairro, que já está circulando", diz o comandante.
Para garantir mais homens nas ruas, ainda no policiamento preventivo, o coronel Rogério Andrade informou que está concluindo um estudo e que pretende liberar PMs dos setores administrativos dos batalhões. Segundo ele, os locais serão escolhidos pela análise de índices de criminalidade e casos pontuais. O coronel não adiantou quantos policiais serão transferidos para o patrulhamento ostensivo nem quais bairros serão beneficiados, segundo ele, para manter o sigilo da estratégia.
COMO FICOU?
ASSALTO NO BELVEDERE

Em busca de pistas
A Polícia Civil ainda não tem pistas sobre o homem que atirou contra o empresário César de Moura Gomes, no dia 10. O retrato falado foi divulgado esta semana, mas as informações não contribuíram para as investigações, segundo o delegado responsável pelo caso, Wilson de Oliveira. O resultado das análises da perícia na mochila abandonada pelo criminoso e nos pertences pessoais, que podem ajudar a identificá-lo por DNA, deve ficar pronto em até 30 dias. César continua internado no CTI do Hospital de Pronto-Socorro João XXIII. Ele está sedado, respirando por aparelhos. O estado de saúde dele é grave.

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