domingo, 23 de setembro de 2012

Editoras investem no ‘daddy porn’.

O mercado está desesperado para encontrar uma “resposta” ao fenômeno 50 Tons de Cinza. A palavra de ordem nas editoras inglesas é descobrir quem será o próximo ou a próxima E.L. James com seus milhões e milhões de livros eróticos vendidos em todo o mundo. Uma autora contou recentemente a um tabloide que desistiu de oferecer seu romance infanto-juvenil, meio magia à la Harry Potter, meio vampiresco à la Crepúsculo, porque estava cansada de lhe “bateram a porta na cara”. Segundo ela, os editores avisavam que a prioridade agora eram os romances adultos, de cunho erótico, os chamados ‘mummy porn’.
É interessante essa evolução dos fenômenos editoriais nos últimos anos. As cifras espetaculares começaram com Dan Brown e seu Código da Vinci, uma ficção policialesca que tentava decifrar e dessacralizar os dogmas cristãos, evidenciando a religião como instrumento de controle. Em seguida, como se tivéssemos nascido de novo, veio Harry Potter e seu mundo mágico de bruxaria. Um menino bem ao estilo Avenida Brasil; educado durante toda a adolescência para vingar a morte dos pais pelo feiticeiro malvado, alternando momentos de inocência dignos de Rita/Nina e o caráter duvidoso de Carminha. Seguiu-se a saga Crepúsculo, com seus vampiros, lobos e zumbis açucarados e apaixonados, que freavam os ímpetos de morder o pescoço alheio em nome do coração. E foi a partir dela que E.L. James cunhou seus 50 Tons de Cinza, soltando, na base do chicote, a franga e a repressão sexual.
Durante o império do Código, muitos tentaram — sem sucesso — criar fábulas de mistérios religiosos almejando as listas dos livros mais vendidos. Enquanto Harry Potter voava em sua vassoura, nenhum outro herói infantil conseguiu roubar-lhe a vedete. Aberrações vampirescas também sobravam, empoeiradas, nas livrarias ao passo que as sequências de Crepúsculo desapareciam delas. De onde se deduz que a febre sadomasô de 50 Tons também tende a morrer com ele.
Mas há os que ainda tentam, caso da reedição da trilogia The Hand Reared Boy, de Brian W. Adliss. Para quem não conhece os livros, eles foram os 50 tons de toda uma geração de garotos sexualmente reprimidos do início dos anos 70. Trata-se da saga de um menino, Horatio Stubbs, durante a descoberta de sua sexualidade. A editora alardeia o relançamento como a “resposta masculina à trilogia de E.L. James”. O herói passa boa parte do tempo se masturbando, procurando mulheres em série, comendo o mundo inteiro. Até que vai para a guerra, perde as ilusões da juventude e se torna um homem mais consciente – embora não menos tarado. Tudo é descrito à maneira crua masculina, sem o requinte ou a frieza de Christian Grey, herói de 50 Tons. Horatio é um homem como todos os outros, que tenta, até o último momento, alimentar o garoto que existe dentro de si.
Nos 50 Tons, a protagonista encontra o amor à sua maneira; em The Hand Reared Boy, Horatio é até um pouco patético em suas desventuras sexuais. Ele não é sexy, não é um herói do coito. Na verdade, desperta até uma certa piedade diante de seu drama para levar as mulheres para a cama. É o anti-herói erótico, que se parece com a maioria dos homens da vida real. Talvez, por isso, os leitores masculinos possam até se identificar com ele.
Mas o mundo mudou, e não estamos mais no início dos anos 70 quando os garotos tinham que bolar peripécias para ver a vizinha pelada ou conseguir uma revista masculina que aliviasse seus hormônios em ebulição. O sexo está hoje escancarado em toda parte; nas novelas, nos filmes, nos comerciais e, sobretudo, na Internet. Garotos que sonhavam com os seios das atrizes de cinema hoje os encontram com uma banalidade frugal. As divas sexuais não estão trancadas nos dancings ou nos teatros de revista; elas estão, de biquíni, nos reality-shows da TV, rebolando o enorme patrimônio calipígio para todas as idades.
Muito mais excitáveis por estímulos visuais do que por palavras da literatura erótica, qualquer homem hoje em dia achará The Hand Reared Boy um conto de Chapeuzinho Vermelho. Não haverá, portanto, um ‘50 tons’ masculino ou um ‘daddy porn’. Você, aliás, conhece um único homem que tenha gostado do livro? A imaginação sexual dos adolescentes morre quando eles descobrem a senha do pay-per-view do pai ou encontram no YouTube o banho caudaloso de Viviane Araújo na Fazenda. Por isso, quem sabe, Christian Grey esteja fazendo tanto sucesso com as mulheres. Ele sabe manipular o Viagra que mais funciona com elas: a fantasia.

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