quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Radares autuam no trânsito quase o dobro que os fiscais da PM e da Guarda

São quase 100 equipamentos contra 714 agentes. Eficiência mascara escassez de pessoal e falta de fiscalização de normas de circulação, indispensável para a fluidez do tráfego

Guilherme Paranaiba -Estado de Minas
Publicação: 31/10/2012 06:00 Atualização: 31/10/2012 07:18


 ( Euler Júnior/EM/D.A PRESS) Nada escapa do raio de visão desses fiscais, que trabalham noite e dia, sem intervalo nem para o cafezinho, esquadrinhando cada centímetro de sua área de atuação. Não é à toa que eles, totalizando menos de 100 vigilantes eletrônicos em toda a Belo Horizonte, já aplicaram mais multas este ano que a soma de seus 714 “colegas” de carne e osso. Uns flagram motoristas em excesso de velocidade; outros fotografam condutores que ignoram o sinal fechado; os demais, os apressadinhos que invadem a faixa de ônibus. Considerando apenas dados processados pela BHTrans, que excluem vias como o Anel Rodoviário, a BR-356 e a Linha Verde, o domínio da fiscalização eletrônica é flagrante. No primeiro semestre, 63,5% das infrações foram registradas pelos 97 olhos biônicos espalhados pela cidade, enquanto a fiscalização humana, que deveria vigiar os demais 240 tipos de irregularidades previstas no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), responde por pouco mais de 30% das estatísticas.
A realidade escondida por trás desses números – que mantêm a arrecadação de multas em alta – é a precária fiscalização de regras de circulação, como conversões proibidas, fechamento de cruzamentos e paradas em fila dupla. E sua consequência imediata: um trânsito caótico. Para especialistas, o predomínio da fiscalização eletrônica em BH reflete uma dificuldade clara no tráfego da capital: criar mecanismos que inibam motoristas mal-intencionados, que agem se aproveitando de brechas nas ruas e avenidas da cidade. “O radar normalmente não pune o condutor que sabe onde o aparelho está, a não ser por um descuido. Esse motorista respeita os limites naqueles locais, mas sabe que não vai ser pego por cometer outros tipos de deslizes”, avalia o mestre em engenharia de transportes pelo Instituto Militar de Engenharia do Rio de Janeiro (IME) Paulo Rogério Monteiro.
Segundo ele, essa situação é gerada pela falta de pessoal que dê conta de infrações que a vigilância eletrônica não fiscaliza, e também pela mistura de órgãos envolvidos na gestão do tráfego em Belo Horizonte. “O que temos é a junção de atribuições civis e militares no controle do trânsito. O problema é que cada um tem uma função, e isso atrapalha o sistema”, acrescenta o especialista.
Atualmente, a capital conta com militares do Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran) e da Guarda Municipal com bloco e caneta nas mãos. São 456 agentes da PM, mas eles devem fiscalizar também o transporte clandestino, montar operações da Lei Seca, conferir emissão de poluentes, entre outras atribuições. No fim das contas, sobram 162 policiais exclusivamente para o trânsito. Da Guarda Municipal são 258 pessoas. Ainda atuam nas ruas 413 agentes da BHTrans, que desde 2009 estão impedidos pela Justiça de multar.
Não é difícil conferir nas ruas o resultado dessa equação. Na última sexta-feira, a equipe do Estado de Minas flagrou infrações diversas: motoristas falando ao celular, sem cinto de segurança, fazendo conversões proibidas, entrando pela contramão para ganhar tempo, entre outros excessos. Tudo longe dos olhos eletrônicos e mais distante ainda da visão dos fiscais.
Bloco do apito
Apesar dos abusos, dados da PM mostram que vem aumentando o número de autuações feitas por militares. Em 2010, foram quase 180 mil, enquanto em 2011 esse número saltou para cerca de 197 mil. De janeiro a setembro deste ano, o total passou de 210 mil. Já as multas anotadas por guardas municipais vêm caindo. Enquanto no ano passado a média mensal fechou em 11,9 mil autuações, em 2012, até setembro, a média caiu para 10,7 mil por mês. Para o gerente de Atividades Especiais da Guarda, major Ailton de Pádua Vieira, essa queda é explicada pelas obras na cidade. “As intervenções nos obrigam a colocar os guardas para dar prioridade à fluidez do tráfego, com menos oportunidade de fiscalizar os infratores”, argumenta.
O tenente-coronel Roberto Lemos, comandante do BPTran, diz ser impossível ter uma atuação melhor que os radares e repete que os agentes da PM não conseguem estar em toda a cidade. “O radar sempre vai multar mais, porque fica 24 horas por dia naquele ponto. Nossa atuação dá prioridade aos pontos mais críticos, como a área central e corredores. Temos usado até agentes do setor administrativo para tentar diminuir os abusos.”
Apesar de apenas três tipos de irregularidades dominarem o ranking das infrações e todas elas serem flagrados pelos radares, o presidente da BHTrans, Ramon Victor Cesar, sustenta que essas três irregularidades são tratadas como prioridade dentro da estratégia da empresa municipal. “Conter o excesso de velocidade e o avanço de semáforo é crucial para evitar acidentes e salvar vidas. Há estudos que comprovam que a redução da velocidade é decisiva, por exemplo, para diminuir a severidade dos ferimentos  em atropelamentos. E fiscalizar o avanço de faixa de ônibus é importantíssimo dentro da política de favorecimento do transporte público.”

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