BBC Brasil
"Polícia em Paraisópolis (foto: Getty Images)"
Um
grupo de 12 promotores de Justiça elaborou um documento defendendo o
isolamento da cúpula do PCC (Primeiro Comando da Capital) e a
transferência dos líderes da facção criminosa de presídios do Estado de
São Paulo para unidades federais.
'O sistema prisional do Estado
(de São Paulo) não tem condições de assegurar o isolamento de líderes
das organizações criminosas e impedir (...) que exerçam influência e
liderança', diz o documento, ao qual a BBC Brasil teve acesso.
O
tema é sensível e polêmico. O chefe da facção, Marcos Herbas Camacho, o
Marcola, e uma dúzia de criminosos que formam a cúpula do PCC são
detentos do sistema prisional paulista. Segundo o Ministério Público,
eles são capazes de controlar todo grupo, enviando de dentro da cadeia
ordens, por meio de telefones celulares, para gerir o tráfico de drogas,
comprar armas e assassinar rivais e autoridades.
Em 2006, a
transferência dessas lideranças para presídios paulistas de regime
disciplinar mais rígido teria sido, segundo analistas, um dos gatilhos
de uma onda de ataques que parou a cidade e matou quase 500 pessoas.
Uma
série de transferências de integrantes de escalões mais baixos da
facção, que já faz parte da nova parceria entre o Estado de São Paulo e a
União, está programada para ocorrer nos próximos dias. A medida é
interpretada por analistas como um recado do governo paulista para a
cúpula da facção.
O primeiro detento transferido foi Francisco
Antônio Cesário, o Piauí, - um membro do terceiro escalão do PCC tido
como chefe do narcotráfico na favela paulista de Paraisópolis e acusado
de envolvimento em mortes de policiais.
Outras 18 transferências de membros de posições hierárquicas inferiores da facção devem ocorrer ainda em novembro.
Segurança 'máxima'
Porém,
para a Promotoria de Execuções Criminais de São Paulo - o órgão do
Ministério Público que investiga as lideranças do PCC - essa ação não
será suficiente para combater a organização. Para esses promotores,
apenas o isolamento total de Marcola e de todos os membros do segundo
escalão da facção pode desestruturar o PCC.
Os promotores
elaboraram o documento alertando o Procurador Geral do Estado, Márcio
Elias Rosa, sobre a necessidade de 'aceitar as vagas federais' e
transferir a liderança do PCC para outros Estados.
Segundo os
promotores, uma investigação da Polícia Federal mostrou que, mesmo em
uma penitenciária de segurança máxima em Presidente Venceslau, no
interior de Sâo Paulo, os líderes do PCC continuam se comunicando com
subordinados. Para eles, afastar a cúpula da facção de São Paulo os
faria perder o controle da facção e assim a desestabilizaria.
As
primeiras transferências e a discussão sobre adoção da iniciativa entre
as lideranças do PCC ocorrem em meio à escalada da violência com
conflitos armados e assassinatos envolvendo a polícia e a facção
criminosa PCC. Como resultado, mais de 130 pessoas foram mortas só nas
últimas duas semanas o que criou uma sensação de medo generalizado em
São Paulo.
Ajuda da União
A possível transferência de
líderes do primeiro escalão do PCC de presídios paulistas para unidades
prisionais da União pode vir a ser a mais polêmica das medidas
negociadas entre o governador Geraldo Alckmin e o governo federal.
Há
menos de um mês, o governo de São Paulo se dizia capaz de resolver
localmente a atual onda de violência, que vem crescendo desde maio. O
comércio em diversos bairros da periferia tem fechado até três horas
mais cedo. Moradores evitam sair na rua à noite temendo a chegada de
atiradores mascarados em motocicletas - que diariamente disparam tanto
em policiais como em suspeitos de ligação com o narcotráfico.
Escolas de portas fechadas e ônibus incendiados por criminosos também compõe o cenário da capital paulista dos últimos dias.
Esse
pico de violência, ao lado da execução de 90 policiais e de três
agentes penitenciários desde o início do ano, fez o governo do Estado
mudar de estratégia e aceitar ajuda da presidente Dilma Rousseff.
Um
pacote de medidas conjuntas foi adotado. Entre elas, a criação de uma
agência para compartilhar informações de inteligência, ações de combate à
lavagem de dinheiro e intensificação da fiscalização de fronteiras.
Rebeliões
Segundo
Camila Nunes Dias, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da
Universidade de São Paulo e da Universidade Federal do ABC, desde a onda
de ataques de 2006, não há rebeliões significativas em penitenciárias
de São Paulo devido a um processo de acomodação de forças.
Nele, o
governo procura não mandar líderes do PCC para o RDD (Regime
Disciplinar Diferenciado) - um prisão em Presidente Bernardes mais dura
que as unidades de segurança máxima, onde o contato do preso com o mundo
exterior é quase totalmente restrito.
Em contrapartida, e
supostamente de forma não direta ou explícita, segundo Dias, os chefes
da facção impediriam a realização de rebeliões. O governo paulista nega
qualquer tipo de acordo formal com os criminosos.
Na hipótese da
cúpula da facção ser transferida pela atual parceria, segundo Camila, é
possível que sistema prisional se desestabilize. 'Mas não acho que (um
nível de violência semelhante ao de 2006) voltará a acontecer. A
estratégia atual (do PCC) é fazer ataques isolados'.
Ela afirmou
estar pessimista em relação à parceria governamental. 'Não acho que
isolamento e castigo tragam benefícios a longo prazo'. Segundo ela, já
houve parceria em 2006 e ela não impediu a atual onda de violência.
Dias
disse ainda que, em 2001, as lideranças do PCC foram transferidas para
outros Estados. A medida não só não acabou com a facção, como teria
colaborado para aumentar sua zona de influência.
A organização têm
membros na maioria dos presídios de São Paulo, além de ramificações em
ao menos outros cinco Estados e países vizinhos.
Integração
O
cientista social José dos Reis Santos Filho, do Núcleo de Estudos sobre
Situações de Violência e Políticas Alternativas da Unesp, afirmou que a
parceria governamental está no caminho certo ao integrar órgãos como o
Banco Central e a Receita Federal aos esforços de Sâo Paulo para
rastrear e bloquear o dinheiro sujo movimentado pela facção criminosa e
assim asfixiá-la.
Ele afimou também que a integração das polícias e
órgãos de inteligência que foi proposta já deveria ter ocorrido há
muito tempo. 'Hoje, praticamente não existe conversa entre os órgãos por
diferenças ideológicas, políticas e corporativas', disse.
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