terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Freio no celular ao volante » A cada quatro minutos um motorista é multado em BH por conversar ao telefone Gravidade do problema é constatada pela condenação de um condutor por homicídio doloso. projeto de lei aumenta a punição


Mateus Parreiras
Flávia Ayer -Estado de Minas
Publicação: 15/01/2013 06:00 Atualização: 15/01/2013 07:06


 (BETO MAGALHÃES/EM/D.A PRESS)Assim como beber e dirigir, falar ao celular ao volante é uma infração rotineira. A cada 4 minutos um motorista é multado em Belo Horizonte por usar o telefone enquanto dirige. Foram 131.577 infrações no ano passado, ou 8,2% das 1.599.673 aplicadas pelo Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG). Dirigir conversando ao celular é a terceira maior causa de multas na capital, perdendo apenas para excesso de velocidade (34,2% das infrações) e avanço de sinal (14,2%). Em Minas a situação não é diferente. Foram 252.095 multas desse tipo em 2012, 7,6% do total, atrás de alta velocidade (25,6%) e desrespeito ao sinal vermelho (9,7%).

O problema é considerado tão grave que há mobilização no Judiciário e no Legislativo para endurecer as punições. No Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Brasília), uma ação pode abrir caminho para que motoristas que causem acidentes fatais enquanto falam ao telefone respondam por dolo eventual (quando o condutor não tem intenção de matar, mas assume os riscos ao ser imprudente). Na Câmara dos Deputados, a discussão é para tornar a multa mais grave, uma vez que hoje a infração é considerada média, com acúmulo de quatro pontos na carteira e multa de R$ 85,13.

Segundo relatório da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), a distração pelo uso de celular ao volante representa aumento em 25 vezes do risco de acidente. Em 2011, foram 2.755 multas a mais que em 2012 em BH, uma média de 15,3 por dia, contra 14,9 no ano passado. Mas o número real de infrações pode ser maior, principalmente porque as infrações de motoristas falando ao telefone são percebidas e notificadas por agentes de trânsito, enquanto as de alta velocidade e de avanço de semáforo são de equipamentos eletrônicos, como radares e sensores.

O próprio comandante do Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran), Roberto Lemos, admite que há inúmeros obstáculos para que agentes flagrem condutores ao celular, como películas escuras nos vidros e falta de iluminação à noite. “Ainda assim há formas de saber que a pessoa está falando ao aparelho quando trafega em velocidade muito baixa e suspeita”, afirma.
 Segundo a BHTrans, no levantamento do Programa Vida no Trânsito, os celulares foram identificados como causa de 0,1% das ocorrências, sendo 0,2% dos registros de motociclistas. “As pessoas nunca confessam que estavam usando o celular. Para isso, dependemos de testemunhas. Motociclistas têm sido mais flagrados usando os aparelhos dentro do capacete, o que representa ainda mais perigo”, afirma o comandante da PM.

Motorista usava o celular quando morreu em acidente na Curva do Ponteio, em setembro
Motorista usava o celular quando morreu em acidente na Curva do Ponteio, em setembro (Paulo Filgueiras/EM/D.A PRESS- 16/9/2012) Uma das vítimas do uso de celular ao volante foi o estudante de direito Thiago Rocha Lage, de 19 anos, que morreu em 16 de setembro do ano passado, preso às ferragens do Honda Fit que ele dirigia, ao se chocar com uma árvore da BR-356, na altura da Curva do Ponteio, no sentido Savassi. O pai do jovem informou que ele havia terminado um relacionamento e trocava mensagens com a ex-namorada pelo celular e essa pode ter sido a causa do acidente fatal.

Punição rígida

Na Câmara, o substitutivo ao Projeto de Lei 7471/2010 foi aprovado pela Comissão de Viação e Transportes e, para ser enviado para sanção da presidente Dilma Rousseff, precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça e pelo Senado. A infração, hoje considerada média pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), pode passar a ser considerada grave. Em vez de 4 pontos na carteira e multa de R$ 85,13, o infrator receberia 5 pontos e seria multado em R$ 127,69.

Pelo texto do substitutivo, assinado pelo deputado Edinho Bez (PMDB-SC), relator do PL, falar ao volante usando fones de ouvido continuaria como infração média. Se, por um lado, o projeto endurece a punição contra o celular ao volante, por outro autoriza as chamadas quando o motorista contar com tecnologia que libere as mãos do teclado, como rádios com bluetooth. “Concordamos com a ideia de permitir o uso do celular, desde que com auxílio de tecnologias hands free, pois o condutor teria as mãos livres, conversando como se estivesse com alguém a seu lado”, ressalta o deputado.

Enquanto as alterações na lei não chegam, a Justiça tenta apertar o cerco. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região considerou homicídio doloso o caso de um motorista que matou uma policial federal em 2006, no Pará. Quando atropelou a vítima, o condutor conversava ao celular. A decisão é de dezembro e o prazo para recursos já terminou. Segundo o juiz relator, Fernando Tourinho Neto, há caracterização do dolo eventual, pois, além da prova testemunhal de que ele estava sob efeito de álcool e maconha, o réu confessou em juízo que falava ao telefone enquanto dirigia.

Especialista em direito de trânsito, o advogado Thales Lucena, entende que, a exemplo da mistura de álcool e direção, há uma tendência nova no direito de atribuir o dolo eventual em crimes de trânsito. “É quando a pessoa assume os riscos, apesar de não ter intenção direta de matar”, comenta Lucena, que destaca a dificuldade de provar a associação entre o celular e o acidente. “É muito difícil comprovar que a pessoa estava usando o telefone, pois ela dificilmente vai confessar”, afirma.

O que diz a lei

A proibição do uso de dispositivos de comunicação ao volante é clara no artigo 28 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que diz que “o condutor deverá, a todo momento, ter domínio de seu veículo, dirigindo com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito”. Dirigir sem atenção representa infração de trânsito, conforme o artigo 169 do CTB. O caso específico do telefone é abordado pelo artigo 252, que define apenas ser proibido “dirigir veículo utilizando-se de telefone celular” ou, ainda, “utilizando-se de fones nos ouvidos conectados a aparelhagem sonora ou de celular”, configurando infração média com acúmulo de quatro pontos e multa de R$ 85,13. Mesmo o uso de viva-voz está vetado pela lei, uma vez que a proibição é quanto ao uso do aparelho, independentemente da forma de utilização.

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