*IMAGEM ILUSTRATIVA
As
autoridades dos setores estratégicos da segurança pública no Brasil
tentam minimizar, sustentam o discurso da integração, planejam reuniões e
apertos de mão públicos, mas o cotidiano faz surgir o quase inevitável
embate entre as polícias civis e as polícias militares brasileiras.
Todos os dias, em todo o Brasil, há casos reais de rusgas,
estranhamentos e inconformidades nesta relação entre organizações que
deveriam, a princípio, atuar com complementaridade e intimidade.
Mas
por que isto ocorre? Por que, a despeito mesmo dos esforços
governamentais, policiais civis e militares “lá na ponta”, não conseguem
se entender? Elencamos abaixo alguns possíveis motivos.
O CALOR DA OCORRÊNCIA
Imagine
que uma guarnição policial militar passe muitos dias nas ruas à
espreita de determinado suspeito, que vem realizando certa prática
criminosa recorrentemente, até que em determinada ocasião consegue-se
prender o indivíduo em flagrante, portando, por exemplo, algumas gramas
de drogas, balanças de precisão, dinheiro “miúdo” etc. Chegando à
delegacia, o delegado pode (por ser seu direito) entender que não se
trata de tráfico de drogas o delito praticado pelo conduzido, mas apenas
consumo, liberando-o após a lavratura do Termo Circunstanciado de
Ocorrência.
Mesmo
o mais compreensivo dos policiais militares fica frustrado com estas
disparidades entre a interpretação de quem vivenciou o crime no momento
exato em que ocorrera (após suor e esforço) e o julgamento de quem pode
descaracterizar um procedimento por não concordar com a substância dos
elementos que apontam para determinado tipo de crime.
HIERARQUIA E DISCIPLINA
Em
regra, policiais militares estão acostumados a cumprir ordens: exceto
as manifestamente ilegais. Esta cultura é favorecida pela estrutura
hierárquica nas corporações PM, e pelos regulamentos que impõem
procedimentos garantindo o cumprimento dos mandamentos superiores. Esta
estrutura “pesada” não é encontrada nas polícias civis, de modo que a
relação entre seus policiais é bem distinta da relação vigente nas PM’s.
Em
atos de serviço, não é incomum que policiais civis e militares se
estranhem por medirem o colega da outra corporação a partir da cultura
de sua própria polícia. É oficial da PM achando que manda em policial
civil como manda em seu subordinado. É policial civil prorrogando
procedimentos como se o policial militar tivesse algo a ver com o ônus
estrutural de sua atividade, e por aí vai…
DISTINÇÃO DE PRIVILÉGIOS
Em
todos os estados, o tratamento do governo com as polícias é o seguinte:
policiais civis ganham mais que policiais militares, mesmo estando em
funções com níveis hierárquicos semelhantes (um agente em início de
carreira provavelmente ganha mais que um soldado em início de carreira).
Isso ocorre simplesmente porque, para os governos, é menos oneroso
conceder aumento salarial e distribuir privilégios às polícias civis,
com menor efetivo, do que às polícias militares. O tratamento
diferenciado sempre gera ciúmes.
BÔNUS POLÍTICO
Se
em uma mesma corporação, com apenas uma cultura organizacional, é
difícil desafazer a lógica ilhada que costuma orientar a administração
pública, onde cada microunidade de poder tenta se posicionar melhor
politicamente que as demais, evitar isto entre duas corporações tão
distintas é trabalho hercúleo. Para se manter chefiando delegacias,
batalhões e unidades semelhantes delegados e oficiais precisam mostrar
brilho e empenho aos superiores (leia-se, ao governo). Nem sempre o
“bolo” da visibilidade política pode ser dividido. Resultado: disputa e
rivalidade.
PM À PAISANA E PC OSTENSIVA
Toda
polícia civil flerta com a atividade ostensiva: padroniza viaturas,
monta grupos táticos para grandes operações e chega até a patrulhar em
determinados eventos e/ou localidades. Toda polícia militar flerta com a
investigação: através do seu serviço reservado, a chamada “P2″ acaba
atuando semelhantemente às polícia civis, muitas vezes sem
compartilhamento de informações.
Por
serem polícias “pela metade”, as duas anseiam a parte da outra que lhes
falta, e a negociação destes pedaços geralmente acaba em
desentendimento.
Como
se vê, não são poucos os elementos que provocam esta relação explosiva
entre as polícias militares e as polícias civis. É inevitável e
necessário que se conceda às corporações policiais brasileiras condições
de igualdade funcional-estrutural, ampliando suas atribuições, evitando
a desgastante e nociva relação de interdependência existente com o
ciclo policial quebrado.
Ciclo
completo e isonomia de benefícios (inclusive salarial) e
responsabilidades são passos sem os quais não se mudará o atual contexto
de ineficiência das polícias brasileiras.
Fonte: Abordagem Policial (Danillo Ferreira)
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