08/05/2013 06h00
- Atualizado em
08/05/2013 06h00
Armadilha será colocada em ribeirão de Barra Longa, em MG.
Voluntário vai ganhar R$ 1 mil para ficar dentro de gaiola.
Retrato-falado do Caboclo d'Água feito pela
Acam a partir de relatos de moradores que
dizem ter visto a criatura.
(Foto:Divulgação/ Acam)
Acam a partir de relatos de moradores que
dizem ter visto a criatura.
(Foto:Divulgação/ Acam)
Peludo, de dentes, unhas e olhos grandes e apetite voraz. Estas podem
ser características de muitos animais. E é assim também como os
moradores de Barra Longa,
na Zona da Mata mineira, descrevem o Caboclo d’Água. Os relatos de
ataque são inúmeros, e muitos ribeirinhos juram ter visto a aparição.
Folclore ou realidade, o caboclo se tornou parte do cotidiano dos
fazendeiros e pescadores do Ribeirão do Carmo. Há até uma oferta de R$ 1
mil para quem servir de isca para o “bicho” dentro de uma gaiola. O
voluntário ficará 24 horas com parte do corpo na água atraindo a atenção
do caboclo.
Membros da Associação de Caçadores de Assombração de Mariana (Acam),
responsável pela empreitada, dizem que vão ficar a postos para tirar uma
foto ou mesmo capturar a criatura. “Tem que encarar com mais
seriedade”, afirma Leandro Henrique dos Santos, jornalista integrante da
Acam, sobre o convívio dos moradores com o suposto animal.
Não é a única recompensa por um flagrante do Caboclo d’Água. Quem
conseguir uma foto e entregar à associação vai receber R$10 mil. O grupo
tem ainda uma série de equipamentos para ajudar na captura. É o caso de
rádios, câmeras fotográficas, redes e GPS, sem contar armas não letais.
Para a nova armadilha, foi desenvolvido um feromônio com objetivo de
despertar o olfato do caboclo. A substância é feita com sangue de
bezerro. Leandro dos Santos diz que é eficaz. Segundo ele, no primeiro
teste “apareceu cachorro de tudo quanto é lado”. O problema é chamar
atenção demais: “O medo nosso é aparecer onça”. Situação onde a única
alternativa dos caçadores será correr.
Quem se arriscar a virar isca, também precisa estar atento. Os dois
voluntários – disponíveis “por enquanto”, ressaltou Leandro ao contar da
desistência de uma terceira pessoa, temerosa de uma falha no plano –
vão passar por exames e consulta médica para atestar se têm capacidade
de ficar um dia inteiro na beira do ribeirão e enfrentar o caboclo se
necessário. A gaiola de metalon foi fabricada em semelhança às
armadilhas de pescadores. Na estratégia traçada pela associação, o
Caboclo d’Água vai entrar por um buraco no meio da gaiola, na parte
coberta por água, e, assim como os peixes, tentará sair pelas laterais,
ficando preso. Neste momento, o voluntário precisa sair por outra
entrada, acima da cabeça dele; de preferência, rapidamente.
Jaula que será usada para capturar o caboclo. (Foto: Divulgação/Associação de Caçadores de Assombração de Mariana)
Mas não vai faltar ajuda. A associação está negociando com a prefeitura
da cidade para que uma ambulância fique no local enquanto durar a
caçada. E o voluntário assinará um termo de compromisso antes de fazer
parte da armadilha.
A criatura já é conhecida por todos da região devido à ferocidade. Os
dentes e unhas grandes podem causar estrago, como explica Mucci Kfouri,
açougueiro que diz ter encarado o caboclo mais de uma vez. “O bicho é
brutal, é muito sinistro. Ele fura a barriga do animal e come as tripas,
dentro da cabeça também. E chupa o sangue, mas deixa a carne”, contou.
Há dois anos ele o viu fazendo banquete de um boi. “Não é sempre que ele
ataca, mas de dois em dois meses ou uma vez no mês tem algo estranho
acontecendo”, disse.
Caçadores da associação sobre armadilha. (Foto:
Divulgação/Associação de Caçadores de
Assombração de Mariana)
Divulgação/Associação de Caçadores de
Assombração de Mariana)
Um mapeamento dos pontos de ataque feito pela associação mostra que as
aparições estão mais frequentes. Leandro dos Santos acredita que parte
do represamento do Ribeirão do Carmo é a causa. Mas as histórias de
encontros com o Caboclo d’Água são antigas. Há registros de até 60 anos
atrás. “A gente cresceu ouvindo falar nisso aí. É uma história antiga de
Barra Longa”, disse Milton Brigolini Neme, professor na Universidade
Federal de Ouro Preto (Ufop) e presidente da Acam.
Há também um retrato-falado para ajudar nas buscas. O desenho foi feito
a partir dos relatos dos moradores dizem ter estado diante da fera.
Crença
Animal ou assombração? Esta é outra dúvida dos moradores de Barra Longa. Kfouri acredita no sobrenatural: “É um cruzamento estranho. Na mata, você vê tanta coisa diferente. Pode ser o cruzamento de um homem com outra coisa”.
Animal ou assombração? Esta é outra dúvida dos moradores de Barra Longa. Kfouri acredita no sobrenatural: “É um cruzamento estranho. Na mata, você vê tanta coisa diferente. Pode ser o cruzamento de um homem com outra coisa”.
Para Santos, o caboclo é um animal ainda desconhecido pelos cientistas.
Ele conversa constantemente com um biólogo argentino, conta, e discutem
a possibilidade de haver em Minas um espécime pré-histórico.
Os caçadores às vezes são desacreditados por pessoas “de fora”, que
acreditam nas investidas de uma onça. Leandro resolve a dúvida de modo
enfático: “Onça não come por dentro da vaca e deixa a parte de fora”.
Vicente Oliveira, também membro da Acam, que trabalha ainda como chefe
de segurança da Ufop, explica que a previsão é programar a armadilha
para maio, quando o nível do ribeirão terá diminuído. Os protetores dos
animais – ou das assombrações – não devem se preocupar. Como ressalta
Kfouri não há intenção de ferir o caboclo. “A gente quer pegar ele, não
quer matar”, disse o açougueiro, esperando a oportunidade de reencontrar
o velho conhecido.
Folclore
“Cada um vê o caboclo do jeito que quer”, afirma o folclorista Carlos Felipe Horta. O especialista explicou que a figura se modifica ao longo da história e dependendo da região, havendo relatos em todo o Brasil e no exterior. Resumindo, é um ser da água, como as sereias e o boto, mito tradicional entre populações ribeirinhas e de áreas litorâneas. Ele destaca ainda os dois maiores cursos d’água do país, de onde exala esoterismo, os rios Amazonas e São Francisco.
“Cada um vê o caboclo do jeito que quer”, afirma o folclorista Carlos Felipe Horta. O especialista explicou que a figura se modifica ao longo da história e dependendo da região, havendo relatos em todo o Brasil e no exterior. Resumindo, é um ser da água, como as sereias e o boto, mito tradicional entre populações ribeirinhas e de áreas litorâneas. Ele destaca ainda os dois maiores cursos d’água do país, de onde exala esoterismo, os rios Amazonas e São Francisco.
E é no Norte de Minas, em Januária, que o caboclo se assemelha a um
homem negro e alto, com cabeça em formato de cabaça, cuja diversão é
assustar pescadores usando uma faca. Ainda no Norte do estado e no
Jequitinhonha, ele também é encarado como o próprio diabo em disfarce
para “aprontar” com os humanos.
Mas o caboclo também é uma figura benfazeja para alguns, sempre
ajudando na pescaria. Para tal, basta lhe entregar um presente – fumo é o
preferido – quando pedido. A recusa termina em um banho de rio.
Horta ressalta ainda que uma característica predomina: ele é um
homem-peixe ou peixe-homem. Afinal, as pessoas deram origem ao Caboclo
d’Água. “A criação de personagens é sempre humana. Depende dos nossos
temores, das nossas crenças”, diz.
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