Proposta em discussão nas comissões permite a venda para qualquer brasileiro com 25 anos ou mais, sem antecedentes criminais. Porte de armas continuará restrito
A Câmara estuda uma proposta de revogar o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03),
existente desde 2003 e que restringiu e dificultou a venda e o porte de
armas para civis. Deputados se preparam para colocar em pauta na
Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, ainda antes do
recesso parlamentar de julho, um projeto que visa facilitar a compra de
armas no país para autodefesa.
O artigo 35 do Estatuto do Desarmamento trazia a possibilidade de
proibição total de compra e porte de armamento para civis. Para isso
acontecer, era preciso fazer uma consulta à população. Em 2005, um
referendo realizado em todo país manteve a possibilidade da venda de
armas e munições no Brasil dentro das restrições previstas. Na época,
64% dos eleitores rejeitaram a restrição por completo. Adaptar à
legislação à vontade da população é o argumento usado agora para revogar
o estatuto.
De autoria do deputado Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC), o projeto
altera os critérios para aquisição de armas, suprimindo a obrigação de
comprovar “a efetiva necessidade”, como exige a legislação em vigor. As
regras para a cassação do direito de porte de armas são semelhantes às
atuais, e a fiscalização ficará a cargo dos órgãos policiais dos
estados e do Distrito Federal, sob supervisão do Departamento de
Polícia Federal, por intermédio do Sistema Nacional de Armas (Sinarm).
Apesar de facilitar a compra de armas, a proposta mantém o porte
restrito.
Para portar uma arma de fogo, será necessário, segundo o projeto, ter
no mínimo 25 anos e não possuir nenhum antecedente criminal. Será
preciso ainda fazer antes um treinamento de manuseio e tiro, além de
não poder responder a processos criminais. O porte de arma sem
autorização será considerado crime. “Acredito que a pessoa, para ter o
porte de arma, precisa ter maturidade. É preciso uma pessoa madura
para que ela tenha equilíbrio psicológico e não coloque, de forma
irresponsável ou aleatória, em risco a vida de outras pessoas”, diz o
relator da proposta na Comissão de Relações Exteriores e Defesa
Nacional da Câmara, Cláudio Cajado (DEM-BA).
Atualmente, a concessão e renovação do porte de arma e a fiscalização
cabem ao Sinarm. “Acho que o porte tem que ter critérios e regras bem
estabelecidos na lei para que a pessoa possa ter o direito a portar a
arma. Mas o registro não pode ser tão restritivo como é hoje. Atendidos
os pré-riquisitos que a lei prevê, aí qualquer cidadão poderá adquirir a
sua arma e tê-la em casa, mas não para transportá-la consigo”, explica
Cajado.
Direito e restrição
O deputado baiano defende a aprovação do texto com a premissa de
assegurar “o direito universal à posse de armas”, ao mesmo tempo em que
restringe o porte. “O Estatuto do Desarmamento foi feito para que o
referendo ratificasse todo o entendimento de que não deveria haver arma
protegendo o cidadão. Só que, como o referendo disse não ao estatuto e
consequentemente ao desarmamento, nós ficamos com uma vacância
legislativa. Ou seja, há um descompasso entre a vontade da população e
as ações do governo. O governo tenta de todas as formas obstaculizar
esse desejo, essa vontade expressada nas urnas pelo plebiscito”,
justifica o deputado.
Cajado também defende a substituição da lógica da desvalorização da
vida e do fomento da insegurança ao favorecer a autodefesa dos
cidadãos, o que dificultará a ação criminosa. “A existência de parcela
da sociedade apta a defender suas vida e propriedade, na ausência
eventual de agente do poder público que o proteja, desestimulará os
delinquentes de agredirem os interesses juridicamente protegidos, ao
atacarem indistintamente as pessoas de bem”, argumenta.
Votação
O tema é considerado polêmico entre deputados. Especialmente quando
outros assuntos relacionados à violência e à segurança pública estão
sendo discutidos, como a redução da maioridade penal. Desde a entrada em
vigor, em 1º de janeiro de 2004, o Estatuto do Desarmamento já foi
modificado quatro vezes. Em boa parte, para ampliar as categorias
profissionais que podem ter acesso ao porte de armas. Em 2004, por
exemplo, ficaram autorizados os integrantes de guardas municipais de
cidades com mais de 50 mil habitantes. Em 2007, entraram integrantes das
carreiras de auditoria da Receita Federal de auditoria fiscal do
Trabalho, além dos demais auditores fiscais e dos analistas tributários.
“É uma proposta muito polêmica. Temos que reservar uma sessão só para
ela. Mas vamos analisar e colocar em votação assim que der,
possivelmente mais para o fim do mês”, afirma o presidente da Comissão
de Relas Exteriores, Nelson Pellegrino (PT-BA). Uma vez aprovado, o
texto ainda será analisado pelas comissões de Segurança Pública e
Combate ao Crime Organizado e de Constituição e Justiça antes de ser
votado em plenário.
O relator reconhece o caráter controvertido do projeto. “Este é o
projeto mais polêmico em discussão na Câmara atualmente. Acredito que
vai ser um grande debate ainda, apesar de eu ter tentado ao máximo
aprofundar a discussão sobre armamentos e munições”, acrescenta
Cajado, que entregou o seu relatório à comissão na semana passada.
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