28/12/2013
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03h00
ALVARO BATISTA CAMILO
ESPECIAL PARA A FOLHA
ESPECIAL PARA A FOLHA
O desconhecimento do que é a Polícia Militar no Brasil leva as pessoas a
pensarem, erroneamente, em treinamento de guerra e inimigos. Segundo
esse pensamento, a desmilitarização seria a solução para eventuais
deslizes e ações violentas.
Só neste ano, em São Paulo, mais de 55 policiais militares perderam a
vida defendendo o cidadão e cerca de 400 ficaram feridos, alguns com
sequelas para o resto da vida. Isso aconteceu porque eles internalizaram
valores que lhes foram transmitidos no consistente e demorado curso de
formação, reiterados pelos comandos diuturnamente.
O militarismo nas polícias é a forma de internalizar valores éticos,
morais, de ordem e respeito às pessoas. Essa conduta é responsável por
tornar os policiais militares homens e mulheres diferenciados por seu
comprometimento com a defesa da vida e da dignidade, morrendo por seu
ideal, se necessário for. Pelos indicadores apontados, isso não é apenas
retórica.
A polícia de hoje é uma polícia cidadã, focada na prestação de serviço. O
policial militar não tem inimigo a ser eliminado. Tem um infrator da
lei que deve ser preso e entregue à Justiça (Giraldi, 1999).
Todo treinamento nas escolas da Polícia Militar –todas de nível
superior– tem esse foco. Há uma disciplina específica de direitos
humanos e seus conceitos, junto com a filosofia de polícia comunitária e
de gestão pela qualidade, norteiam as ações policiais. Lá se ensina que
a razão de ser da polícia é o cidadão.
Os erros e desvios, quando acontecem –e acontecem, como em qualquer
profissão–, são rigorosamente punidos por meio de uma corregedoria forte
e atuante, que não sobresta procedimentos, que não transfere policial
como solução, que não prescreve aposentadoria com salário integral como
punição, que não se intimida e expulsa os policiais que não honram seu
"compromisso com o cidadão" (slogan da PM de São Paulo em 2010).
Agora que os indicadores não estão tão bons, fala-se muito em mudanças.
Mas se ignora que a Polícia de São Paulo foi o fator fundamental no
maior exemplo de combate à criminalidade no mundo ao fazer cair os
homicídios nas 645 cidades do Estado consecutivamente por 12 anos em
72%.
Destaque-se: a queda não se efetivou em apenas uma cidade, como Bogotá ou Nova York.
Erra quem compara os indicadores de letalidade policial com aqueles
existentes nos Estados Unidos e demais países com legislação forte e
poucos confrontos. Não considerar essas premissas é o mesmo que comparar
banana com laranja.
Caro leitor, a Polícia Militar exerce papel principal nessa conquista,
pois o indicador cai quando o crime não acontece. Para isso, é
fundamental a prevenção feita pela PM, com planejamento e inteligência,
de forma competente.
Cada país tem a sua peculiaridade, o seu arcabouço legal, a sua herança
cultural, e no Brasil não é diferente. As Polícias Militar, Civil e
Federal têm missões definidas e se completam, na medida de sua
competência constitucional. Precisamos aperfeiçoá-las, com melhor
treinamento e salários dignos, e exigir que cada vez mais prestem
melhores serviços aos cidadãos, aprimorando os seus processos
demissórios para banir de seus quadros aqueles que não se enquadrarem na
nova ordem.
A Polícia Militar é o sustentáculo da democracia, a garantidora do
Estado democrático de Direito, o último anteparo do cidadão contra a
criminalidade e, em muitos locais, o único. Devemos trabalhar para que
ela melhore sempre, a cada dia, dentro do princípio da melhoria contínua
que também a norteia. Depreciá-la, desmerecê-la, desmilitarizá-la é um
grande erro.
ALVARO BATISTA CAMILO, 52, administrador de empresas, é vereador
de São Paulo pelo PSD. Foi comandante-geral da Polícia Militar de São
Paulo (de 2009 a 2012)
*
28/12/2013
-
03h00
MARCELO FREIXO
ESPECIAL PARA A FOLHA
ESPECIAL PARA A FOLHA
O que a sociedade deve esperar de policiais militares que, ao longo de
sua formação, são obrigados por seus superiores a se sentar e a fazer
flexões sobre o asfalto escaldante, que lhes provoca queimaduras nas
mãos e nas nádegas?
Como esses soldados, submetidos a um treinamento cruel e humilhante, se
comportarão quando estiverem patrulhando as ruas e atuando na
"pacificação" das comunidades? Como uma instituição que não respeita os
direitos de seus membros pode contribuir com a democracia?
Dar respostas a essas perguntas se tornou ainda mais urgente após a
morte do recruta da Polícia Militar do Rio de Janeiro Paulo Aparecido
Santos de Lima, de 27 anos, em novembro. Membro da 5ª Companhia Alfa,
ele foi parar no CTI (centro de terapia intensiva) do hospital central
da PM após ser submetido a um treinamento que mais pareceu uma sessão de
tortura, no CFAP (Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças).
Além de Paulo, outros 33 recrutas passaram mal e 24 sofreram queimaduras
nas mãos ou nas nádegas. Segundo relatos de colegas, quem não suportava
os exercícios sob a temperatura de 42 graus Celsius –a sensação térmica
era de 50 graus Celsius– levava um banho de água gelada ou era obrigado
a se sentar no asfalto.
E o caso não é isolado. Após a morte de Paulo, o Ministério Público
ouviu recrutas da 5ª Companhia Alfa. Eles confirmaram os castigos cruéis
e contaram que os oficiais não davam tempo suficiente para que se
hidratassem. Alguns tiveram que beber água suja na cavalaria. Segundo
informações da enfermaria da unidade, alunos chegaram a urinar e vomitar
sangue. O secretário estadual de Segurança do Rio de Janeiro, José
Mariano Beltrame, classificou a morte como homicídio.
Até policiais experientes não resistem a esses treinamentos. Neste mês,
na Bahia, os soldados Luciano Fiuza de Santana, 29, e Manoel dos Reis
Freitas Júnior, 34, morreram após passarem mal num teste de aptidão
física para ingressar no Batalhão de Choque. Outros precisaram ser
hospitalizados.
A tragédia envolvendo o recruta fluminense e os policiais baianos,
infelizmente, não é só do Rio e da Bahia, mas de toda a sociedade
brasileira. Em todos os Estados do país, a PM é concebida sob a mesma
lógica militarista e antidemocrática.
Ninguém precisa ser submetido a exercícios em condições degradantes e a
castigos cruéis para se tornar um bom policial. Em vez de se preocupar
em formar soldados para a guerra, para o enfrentamento e a manutenção da
ordem de forma truculenta, o Estado precisa garantir que esses
profissionais atuem de forma a fortalecer a democracia e os direitos
civis. A realização dessa missão passa necessariamente por mudanças na
essência do braço repressor do poder público.
Desde as manifestações dos últimos meses em todo o país, quando os
excessos da PM e a sua dificuldade em conviver com o regime democrático
ficaram evidentes, o debate sobre sua desmilitarização se tornou
urgente. A PM é uma herança dos anos de chumbo, uma força auxiliar do
Exército. Mas o que nós precisamos é de uma instituição civil.
Nesse sentido, é fundamental que o Congresso Nacional aprove a proposta
de emenda constitucional (PEC 51/2013) que prevê a desvinculação entre a
polícia e as Forças Armadas; a efetivação da carreira única, com a
integração entre delegados, agentes, polícia ostensiva, preventiva e
investigativa; e a criação de um projeto único de polícia.
Esse debate deve envolver os próprios policiais e as organizações da
sociedade civil. Essa proposta não significa estar contra a polícia, mas
estar a favor dos servidores da segurança pública e da cidadania.
MARCELO FREIXO, 46, professor de história, é deputado estadual pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) no Rio de Janeiro
*
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/12/1390875-e-preciso-desmilitarizar-a-policia-militar-nao.shtml
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/12/1390874-e-preciso-desmilitarizar-a-policia-militar-sim.shtml
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