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CUNHA – Acusações contra o presidente da Câmara enfraquecem batalha pelo impedimento
CUNHA – Acusações contra o presidente da Câmara enfraquecem batalha pelo impedimento

Mesmo com o fôlego obtido por meio das liminares concedidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Dilma Rousseff (PT) ainda se encontra sobre areia movediça. Com menos de 17% do apoio conquistado pelo antecessor Luiz Inácio Lula da Silva na Câmara dos Deputados, a presidente, sustentada pela mais frágil e inconsistente base das gestões petistas, continua sob o martírio da ameaça de processo de impeachment.

O cálculo do governo federal é simples: precisa garantir o voto de ao menos 172 deputados para evitar a abertura do processo e, assim, o afastamento imediato, mesmo que temporário, de Dilma. O problema está justamente na fidelidade da base governista.

Levantamento feito pelo por meio do Basômetro, ferramenta responsável por analisar os votos na Câmara, revela que a presidente pode contar incondicionalmente apenas com dois partidos, integrantes do chamado núcleo duro: PT e PSL. As siglas reúnem 63 deputados e foram as únicas que votaram conforme orientação do governo em mais de 90% das proposições – medidas provisórias, projetos de lei, requerimentos, entre outros.

Para efeito de comparação, Lula, durante o segundo mandato, chegou a aglutinar 12 partidos no núcleo duro, um total de 355 deputados que votaram acima de 90% de acordo com a orientação dos petistas (confira o infográfico).

Sem base

Das nove siglas responsáveis por reeleger Dilma, apenas quatro têm votado conforme orientação do governo em ao menos 80% das proposições – além do próprio PT e do PSL, representado apenas por José Maria Macedo Júnior, do Ceará, PCdoB e PRB integram o grupo. Outros partidos inicialmente aliados têm taxa de votação de oposição.

São os casos do PDT (66%), que inclusive anunciou a saída da base, e do PP (57%), a sigla mais volumosa na Câmara após PT e PMDB. “São duas questões. A primeira é a mudança programática em relação à pauta eleitoral, perdendo, assim, parte de uma base até então coesa. A segunda, é a baixa popularidade. Grupos autoproclamados independentes normalmente seguem o governo, independentemente de qual seja. O que não ocorre atualmente pela baixíssima popularidade”, analisa o cientista político Malco Camargos.

Um desses grupos é justamente o maior bloco da Câmara, liderado pelo PP, com 82 deputados. Se antes o PT já sofria com a imprevisibilidade do PMDB, agora deve padecer também com os progressistas, contrariados com a reforma ministerial e com ímpeto por mais espaço no governo.

“Queremos nos desvincular do PMDB, sempre protegendo os correligionários na seleção de algo importante, como relatores. O PP já apoiou mais o governo, agora não vejo a mesma fidelidade”, reconhece a senadora Ana Amélia (PP/RS), vice-presidente nacional do partido.

Os outros partidos que também estavam na base que reelegeu Dilma não têm apresentado índices confiáveis, como o PSD, do ministro das Cidades, Gilberto Kassab, que apresenta um índice de governabilidade de 70%. Já o PR acompanhou a indicação do governo em 77% das votações, e Pros em 76%.

Governo federal finalmente tem uma semana positiva

Após seguidos reveses nos últimos meses, o governo federal enfim completou uma semana positiva. A forte expectativa de início efetivo do processo de impeachment foi encerrada com ao menos um congelamento da ação e sinalizações de apoio à Dilma Rousseff pelos até então oposicionistas. Três liminares do Supremo Tribunal Federal (STF) barraram rito definido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB/RJ)..

“O Judiciário viu que, tal como estava sendo desenhada a relação entre Executivo e Legislativo, o processo estava baseado muito mais em interesses pessoais do que no papel das instituições. Ocorreu o que Montesquieu chama de pesos e contrapesos nos poderes. Um interfere no outro para evitar excessos”, diz o cientista político Malco Camargos.

Na mesma semana, PSB, que detém 33 cadeiras na Câmara, anunciou que se descolou da oposição e sinalizou ser contrário ao processo de impedimento. O fato político negativo foi o novo pedido de impeachment protocolado por juristas, apoiados pelo PSDB, baseado no argumento da manutenção das pedaladas fiscais pelo governo neste ano.

Rede

Até mesmo a nova bancada formada pela Rede pode ser positiva na luta de Dilma contra o impeachment. Isso porque, dos cinco deputados, dois tinham índices de votação de oposicionistas. “A Rede vai se posicionar contra um possível processo de impeachment por entender que não há fundamento constitucional para isso”, adiantou o líder da bancada, Alessandro Molon, do Rio.

“Há um conjunto de outras bancadas que votarão contra o impeachment. Eles terão tanto espaço com um possível governo (do atual vice Michel) Temer? É possível que não. Eles temem que o governo Temer vá dar mais espaço ao PMDB”, avalia o cientista político Paulo Roberto Figueira Leal, da Universidade Federal de Juiz de Fora.

Operação ‘Lava Jato’ contribui para um cenário político imprevisível, avalia pesquisador

A cada semana um novo nome, incluindo políticos de peso, surge entre os investigados pela operação “Lava Jato”, da Polícia Federal. Essas revelações, que têm se tornado rotineiras, são o principal fator que pode alterar os rumos da possível instalação do impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) na Câmara dos Deputados. A opinião é do cientista político Paulo Roberto Figueira Leal, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

“O que está dando imprevisibilidade é a ‘Lava Jato’, as denúncias. Há um terreno que é muito pantanoso. O próprio Eduardo Cunha (presidente da Câmara) era uma aliado da oposição. Há um conjunto de variáveis que ninguém controla agora, porque provém de um grande e inédito caso, como é a ‘Lava Jato’”, avalia. Essas mudanças de cenário, com a inclusão de políticos em investigações, têm reflexo direto nas votações no parlamento.

Votações importantes

O cientista político enfatiza que, apesar de o núcleo duro do primeiro ano do segundo governo Dilma ser frágil, em uma votação importante, como a de um eventual processo de impeachment, ele deverá crescer, e a presidente deve ter mais votos do que obteve ao longo do ano no parlamento.

“Essas indicações das posições médias não são suficientemente seguras para falar de um tema tão relevante como o impeachment. É razoável supor que ela vá contar com um núcleo duro maior do que o que tem hoje”, acredita.

Em 2015, o apoio volátil de sua base na Câmara dos Deputados fez com que o governo tivesse derrotas importantes. Das 178 votações realizadas até 15 de outubro, o governo perdeu em 21 delas (12%). Apesar de o número ser relativamente pequeno, foram temas caros ao governo, como a redução da maioridade penal, valores do imposto de renda a pessoas físicas, reforma política e ajustes nas aposentadorias.