segunda-feira, 4 de abril de 2016

Economia abalada com atraso de salários e 13º parcelado - Cerca de 40% das prefeituras do Estado não estão em dia com servidores

Falência Múltipla

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Bicos. Sem trabalho na indústria, Valdinei Amorim Farias, 37, tem vivido de bicos como mototáxi
PUBLICADO EM 04/04/16 - 03h00
Ipatinga e Sete Lagoas. Sete em cada dez municípios mineiros tiveram alguma dificuldade para pagar o 13º de 2015, segundo levantamento feito pela Associação Mineira de Municípios (AMM). “Com a crise, 40% das prefeituras do Estado não devem conseguir pagar os salários dos servidores em dia. Isso acontece porque as despesas subiram, em média, 18%, mas os repasses estão caindo, e a receita está estável”, justifica o presidente da AMM, prefeito de Pará de Minas, Antônio Júlio (PMDB).
Em Ipatinga, no Vale do Aço, cerca de 40% dos servidores só começarão a receber o 13º em abril, com quatro meses de atraso. E ele será dividido em cinco parcelas. “No ano passado, tivemos um encolhimento de R$ 30 milhões na arrecadação do ICMS. Foi um golpe para nós. É muito duro planejar um Orçamento, e ele não acontecer. É muito triste, mas tivemos que tomar atitudes extremas, como atrasar o 13º. Mas de onde o município poderia tirar recurso?”, questiona a prefeita de Ipatinga, Cecília Ferramenta (PT).
Em Sete Lagoas, na região Central, além do 13º atrasado, os salários também estão sendo pagos fora da data desde dezembro. No dia 20 de abril, por exemplo, está previsto o pagamento referente a fevereiro, para os servidores que recebem acima de R$ 2.500. “Eu já nem sei mais de qual mês é o salário que estou recebendo, pois estamos com atraso desde o 13º. A gente vem trabalhar desanimado, porque a população não tem culpa, mas é muito difícil”, afirma uma servidora que pediu para não ser identificada.
O prefeito de Sete Lagoas, Marcio Reinaldo Dias Moreira (PP), explica que, diante da redução dos repasses de verbas e do aumento das despesas, a prefeitura está sendo obrigada a fazer uma sangria no Orçamento. “Tapar buraco, fazer asfalto, está faltando dinheiro para tudo. Estamos fazendo todo tipo de engenharia possível. Na área da saúde, cortaremos em 70% o quadro de médicos que ficam de sobreaviso. Hoje, temos cerca de cem, e alguns ganham até R$ 16 mil.
Vamos manter esse plantão só para os casos de necessidade, como cardiologista e nefrologista. Com o corte, pretendo reduzir a folha de R$ 800 mil para R$ 300 mil”, diz.
Em Ipatinga, o secretário da Fazenda, Fábio Mussi, explica que a receita geral até subiu 1,8% no ano passado. “Mas o que aumentou foram as receitas de transferência, que são carimbadas. A de livre movimentação, que vem de impostos ligados ao consumo e que usamos para custeio, inclusive o da folha, caiu de R$ 343 milhões para R$ 334 milhões.” A saída é cortar serviços. Paulo Assis, 44, costumava trabalhar em empreiteiras, mas hoje vive de bicos. “Até consegui ser fichado para prestar serviço e jardinagem para a prefeitura, mas fiquei só dois meses, e cancelaram o contrato”, conta.
Valdinei Amorim, 37, também está vivendo de bicos em Ipatinga. Ele trabalhava em empreiteiras e viu os empregos minguarem, principalmente após o desligamento de um alto-forno da Usiminas. Segundo a Secretaria da Fazenda do município, a cada R$ 100 gerados na cidade, pelo menos R$ 55 vêm da siderúrgica, que passa por uma crise que reflete diretamente nos cofres públicos, com a redução de recolhimento das receitas de livre movimentação.
Alternativas frustradas na saúde
As tentativas das prefeituras de otimizar recursos nem sempre são bem-sucedidas. Em Juiz de Fora, um consórcio para administração do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) piorou o serviço, segundo Amarildo da Fonseca, presidente do Sindicato dos Servidores Públicos do município. “Desde que o consórcio foi inaugurado em 2013, o Samu não funciona. Outro dia eu estava no Pronto-Socorro e tive que ajudar um motorista que não sabia abrir uma maca, porque é terceirizado. Quando o Samu era só de Juiz de Fora era melhor”, relata.
Ele se refere ao Consórcio Intermunicipal de Saúde da Região Sudeste (Cisdeste), que reúne 94 municípios e administra 39 ambulâncias do Samu, que atende 1,6 milhão de pessoas.
O prefeito de Juiz de Fora, Bruno Siqueira (PMDB), diz que o consórcio foi formado em função de promessas da gestão passada do Estado. “Foi uma iniciativa do secretário de Saúde da gestão passada. Ele disse que conseguiria recursos para a saúde. Só para o Hospital Teresinha de Jesus, seriam R$ 2 milhões por mês. O que fez com que os prefeitos se unissem foi essa expectativa”, diz. Segundo ele, a gestão atual foi cobrada, mas sem resultado. “O compromisso foi feito pela gestão passada, e a atual tem dificuldade de assumir”, diz. Já a atual gestão afirma que “não tem ciência de acordos feitos pelo governo passado, sobretudo por não haver registro documental. O Cisdeste é o consórcio que gerencia o Samu; não tem relação direta, no que tange a recursos, com os hospitais”, conclui.
Em Uberaba, a terceirização de duas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) desde janeiro de 2015, foi parar na Justiça. Diante de denúncias de aumento de mortes nas UPAs, o Ministério Público (MP) entrou com uma ação civil pública contra a gestora de ambas, a Organização Social (OS) Pró-Saúde. O MP conseguiu uma decisão favorável na Justiça para que a Prefeitura retomasse a gestão das UPAs. Porém, a Prefeitura recorreu; a situação permanece sendo discutida na Justiça, e a OS continua administrando as UPAs. “Com a terceirização, a qualidade do serviço caiu muito”, opina o professor de ensino técnico Marcos Gennari.
Consórcio

Temporários.
 O gerente do Cisdeste, Rafael Pontes, diz que o consórcio conta com 600 funcionários contratados como temporários e que um concurso público ainda será realizado.
Terceirização
FOTO: MOISES SILVA
ESPECIAL CIDADES POLO
 
“Com a terceirização, a qualidade do serviço (de saúde) sempre piora. Acho que o terceiro setor foi a forma que o Estado encontrou para terceirizar seus serviços” Marcos Gennari, 54 Professor em Uberaba
Promessa vazia
FOTO: FERNANDA CARVALHO / O TEMPO
Problemas da Crise em Minas - Juiz de Fora ( dengue )
 
“O consórcio existe, é positivo, mas a forma como foi prometido para a população e os chefes dos executivos dessas cidades não foi cumprida. O recurso seria usado para contratar médicos”
Bruno Siqueira Prefeito Juiz de Fora

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