quarta-feira, 27 de abril de 2016

Policiais Militares gaúchos que participaram de ocorrência com 4 mortos serão condecorados

Lucas Azevedo
Colaboração para o UOL, em Porto Alegre
Policiais militares gaúchos serão condecorados dias após atenderem a uma ocorrência na qual quatro suspeitos de assalto morreram. O anúncio das concessões das honrarias foi feito nesta segunda-feira (25).
O incidente ocorreu em frente ao hospital Cristo Redentor, no fim da tarde da última sexta-feira (22), na zona norte de Porto Alegre. Segundo a Brigada Militar (PM gaúcha), os soldados trocaram tiros com os suspeitos após uma perseguição, sendo que quatro deles morreram baleados.
De acordo com a corporação, um carro policial com quatro militares suspeitou da atitude dos ocupantes de dois veículos em uma avenida e começou a seguir dos dois carros a distância, enquanto obtinham por telefone os dados das placas.
Quando perceberam que eram segundos, ainda segundo a Brigada, os ocupantes dos dois carros tentaram fugir e teriam atirado contra os policiais, causando ferimentos em dois deles.
Os policiais serão homenageados com a inclusão de seus nomes na lista de agentes condecorados durante a Semana de Tiradentes - patrono da polícia -, em uma cerimônia na Academia de Polícia Militar do Rio Grande do Sul nesta quinta-feira (28). Eles devem receber das mãos do governador José Ivo Sartori medalhas por bravura.
Na manhã desta segunda-feira (25), o secretário da Segurança do Rio Grande do Sul, Wantuir Jacini, elogiou a atitude dos PMs. "Os policiais, no cumprimento do dever, reagiram à injusta agressão de parte de criminosos que estavam portando armas de alto potencial ofensivo e que agrediram primeiro a lei, ou seja, agrediram primeiro a polícia, e a polícia reagiu, dentro do estrito cumprimento do dever legal", destacou em entrevista coletiva.

Ação violenta

Parte da ação policial foi gravada em vídeo por testemunhas que estavam no hospital. Segundo a Brigada Militar, houve confronto em frente ao hospital, com troca de tiros após perseguição pela zona norte da cidade - um carro de polícia perseguiu um veículo Hyundai i30 e um Honda Civic.
Os depoimentos dos policiais mencionam que os dois carros perseguidos estavam ocupados por nove homens, de acordo com a Brigada Militar. Uma câmera de segurança do hospital mostra que um do carros parou em frente à portaria principal. Em seguida, policiais descem do carro atirando contra os ocupantes do Hyundai i30.
Algumas das imagens não permitem concluir que houve tiroteio, mas seus ângulos registrados são bem restritos. Em determinado momento, o motorista do i30 desce do carro. Ele cai no chão e um dos policiais se aproxima. Não é possível saber se o suspeito estava armado nesse momento. O PM, então, aponta a arma para o homem, que levanta as mãos, mas recebe ao menos três tiros, morrendo no local.
Repercussão
"A imagem da morte do quarto criminoso não deixa nenhuma dúvida sobre execução. Posso imaginar mil explicações sobre o motivo pelo qual os policiais assim agiram, mas nenhuma é escusadora da ação. Admito, para argumentação, que no restante do confronto a Brigada Militar agiu corretamente. Naquele momento não agiu, e foi agente da barbárie", escreveu em artigo o juiz Pio Giovani Dresch, que exerceu a presidência da  Ajuris (Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul), em 2012 e 2013.

Para o professor da PUC-RS e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo, há um equívoco na posição do Comando da Brigada Militar, ao, imediatamente após o episódio, informar que os policiais envolvidos seriam homenageados.

"Em momento algum questionei a ação da polícia no sentido de se houve ou não a utilização da técnica adequada. O problema é que uma vez que aconteceu o fato, veio a iniciativa do Comando da BM [Brigada Militar] de condecorar os policiais. Há controvérsias em como eles conduziram a rendição de um dos criminosos. Fica bem claro no vídeo - mas não estou fazendo juízo de mérito - que houve uma rendição e que resultou em uma execução. Se isso aconteceu, de fato, não me parece a técnica adequada", avalia Azevedo.
 Para ele, as pessoas que lidam com o combate à violência têm treinamento para lidar com estresse em situações de combate e conflito. "Se, a partir de agora, o suspeito se rende e é executado, isso significa que não haverá mais a rendição. Vai haver confronto até o final. Já outro vídeo mostra que os policiais, após encerrado o conflito, alteraram o local. Ficaria a palavra dos policiais contra a das vítimas, num contexto em que a sociedade vê os criminosos como merecedores de algo desse tipo."
Segundo Azevedo, a homenagem deveria ser suspensa até que o inquérito policial que está sendo conduzido pela Polícia Civil seja encerrado. "Me parece que seria fundamental suspender a condecoração até o esclarecimento do fato por meio de perícia e procedimentos que tenham condições de avaliar. No contexto que estamos, a demanda é por justiçamento. Mas a polícia não pode entrar nessa lógica."

Por outro lado, a ação do policial foi tida como correta e exemplar por Marcos Do Val, brasileiro instrutor da Swat norte-americana. "Numa operação policial, são tantos os fatores que envolvem o momento, que você tem milésimos de segundos para tomar uma decisão. No momento em que a pessoa está sentada no chão, pelo que dá para observar, ainda continuam os disparos. E aquela pessoa sai do carro e deixa cair uma arma longa. Geralmente quem tem uma arma dessas leva outra curta escondida. Então o PM deu continuidade à ação, cobrindo os outros colegas policiais."

Para Do Val, não houve execução. "Seria execução se não houvesse troca de tiros, nem resistência, se o policial algemasse o suspeito e o executasse. Isso sim é uma ação de execução. Numa situação dessas, não dá tempo para prender, algemar e colocar de barriga para baixo, porque os tiros continuam. Depois, quando se consegue analisar na frieza de nossa casa, acabamos fazendo críticas injustas."
Sobre a imagem do vídeo que mostra um dos ocupantes do i30 sendo baleado, as autoridades gaúchas não se pronunciaram. Nem a Brigada Militar, nem a corregedoria da corporação e nem a Secretaria de Segurança Pública quiseram comentar especificamente essa questão.
A Brigada manteve o seu posicionamento oficial de que a ação dos policiais foi correta, seguindo a declaração do secretário Jacini.

Ferimentos

Dos policiais que participaram do tiroteio, dois foram atendidos no hospital com tiros de raspão na cabeça, no braço e no punho esquerdo. Eles passam bem e já foram liberados. Os PMs já prestaram depoimento à Polícia Civil, responsável pelo inquérito.
A reportagem do UOL tentou toda tarde contato com a Corregedoria da Brigada Militar para apurar a conduta tomada pela corporação quando há mortes em confrontos, mas não obteve retorno.

Os quatro suspeitos mortos foram identificados pela polícia como Júlio César de Moura Santana, 22 anos, Anderson Henriques da Silva, 29, Cláudio Bandeira da Silva, 19, e Luiz Cainan Ribeiro da Silva, 21. Todos tinham antecedentes criminais.
 

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