sábado, 22 de março de 2014

Valadarenses fizeram ‘saga’ pelo visto norte-americano

A cidade chegou a chamar a atenção das autoridades responsáveis pela entrada e saída de pessoas no país devido ao número de pessoas interessadas no visto nas últimas décadas
FOTO: Agatha Brunelly
HÁ DEZ anos, segundo especialistas do ramo de turismo em Valadares, busca pelo visto norte-americano era intensa na cidade
GOVERNADOR VALADARES -
Governador Valadares é um dos municípios brasileiros mais conhecidos por enviar pessoas aos Estados Unidos da América. Há cerca de dez anos o volume de emigrantes valadarenses que buscavam as mais diversas cidades americanas era intenso. Pela quantidade de pessoas que se mudaram para os EUA naquela época, seja de forma ilegal ou com o visto de turismo apenas como disfarce para entrar no país, Valadares começou a chamar atenção das autoridades responsáveis pela entrada e saída de pessoas no país.
A cidade se tornou nome mais que conhecido nos consulados norte-americanos no Brasil. Em média, três vans com 12 pessoas partiam semanalmente de Valadares em direção aos Consulados Gerais para entrevistas de vistos. Nessa excursão muitos queriam o documento para conseguir entrar nos EUA legalmente e por lá ficar como ilegal, excedendo o prazo de permanência. Porém, na época, o fluxo de mudança ficou tão excessivo, que pessoas interessadas em apenas visitar os EUA não já conseguiam fazer a viagem facilmente. Os moradores da cidade ganharam fama por não conseguirem o documento e terem tratamento diferenciado — de forma negativa — na hora da entrevista.
Segundo Amanda Coelho, diretora de uma agência de turismo de Valadares, há 10 anos aconteceram diversos casos de pessoas que tiveram o visto negado só porque eram do município. "Muitas pessoas, até mesmo aquelas que queriam realmente fazer turismo, tiveram o visto negado sem ao menos apresentarem algum documento ou o cônsul perguntar algo. Quando a pessoa chega para a gente e diz que a entrevista não foi muito boa, ou que ela achava que a negativa do visto teve algum motivo, um parente próximo ilegal nos EUA ou a falta de vínculo no Brasil nós entendemos a situação. Mas, antes, não existia isso. Antes era só olhar o passaporte, ver que era de Valadares e a pessoa era negada", afirmou Amanda.
Apesar do histórico negativo que a cidade tinha nos consulados, a demanda pelo agendamento de entrevistas consulares não diminuía. Portanto, as agências começaram a buscar meios para amenizar o fato de os interessados serem de Valadares. "Antes existia aquela coisa de escolher o consulado pela reputação que ele tinha. Por exemplo, o consulado do Rio de Janeiro tinha uma bronca com Valadares porque eles já conheciam o perfil das pessoas. Parecia que o pessoal de lá era treinado contra a gente. Por conta disso a gente não usava o consulado do Rio, era só São Paulo ou Brasília", comentou Amanda.
Para Chico Teixeira, proprietário de outra agência e pioneiro no turismo de Valadares, não importava a quantia que as pessoas tinham no banco ou os vínculos dela no Brasil. Os relatos de pessoas que não conseguiram o visto porque eram de Valadares ficaram tão grandes que alguns forjavam os documentos para fraudar o local onde nasceram. "Antigamente Governador Valadares era o maior centro brasileiro exportador de mão de obra para os EUA. Para se ter ideia, Valadares foi a única cidade a que uma consulesa veio para ter uma conversa com representantes e pessoas ligadas à emigração sobre essa enorme demanda das pessoas para os EUA. Nessa época, as pessoas fraudavam os documentos para dizerem que eram nascidos em outras cidades como Caratinga e Teófilo Otoni", relatou.
PANORAMA ATUAL
Atualmente a situação em Valadares é diferente de 10 anos atrás. Segundo Chico Teixeira, em comparação com a época do boom emigratório no município, o fluxo de interessados em tentar o visto ainda é constante, porém, menor. Hoje, uma vez ao mês, viaja um ônibus com cerca de 40 pessoas em direção ao Consulado Geral dos EUA no Rio de Janeiro. Para ele, não só a quantidade se modificou como o perfil das pessoas que se propõem a tentar o visto norte-americano. "O perfil das pessoas que busca a nossa agência para ir ao consulado é de turistas ou pessoas que vão para visitar parentes ou amigos que emigraram para lá naquela época. Hoje em dia as pessoas vão e voltam", assegurou.
De acordo com Amanda, a posição dos consulados também se alterou com o passar do tempo. "Hoje a gente sente que as pessoas estão mais respeitadas, porque o Consulado está tendo mais interesse no brasileiro devido ao perfil que tem mudado. Hoje o brasileiro chega no Consulado e é muito diferente de antigamente. Aqui na agência o que eu percebo é que se a pessoa é de Valadares ou não, isso já não faz mais diferença. O retorno tem sido muito positivo. Atualmente a gente pode mandar o ônibus cheio, de 35 a 45 pessoas, para o Rio que ele vai voltar com o resultado muito positivo. Já houve meses em que metade do ônibus voltava com o visto", explicou a diretora.
Há dez anos diversos valadarenses não conseguiam o visto por conta do local do nascimento. Porém, mesmo hoje em dia, essa situação pode estar sujeita a acontecer. A.A.F. (*) é professora efetiva no município de Valadares e pelo Estado de Minas Gerais. Ela tentou o visto americano duas vezes, e em ambas teve o pedido recusado. A primeira tentativa aconteceu em 2010, no Rio. A segunda, em 2011, em São Paulo. Segundo ela, o único fator que pode tê- la impedido de conseguir o documento foi a cidade em que nasceu.
"Na primeira vez, no Rio, o cônsul foi muito áspero comigo, me fez as seguintes perguntas: por qual motivo eu queria ir ao EUA; com quem eu iria; e se eu teria conhecidos no referido pais. Todas as perguntas foram feitas com muita rispidez, e a última foi repetida pelo menos três vezes. Não me pediu documento nenhum. E simplesmente me negou o visto. A entrevista durou cerca de três minutos, no máximo", relatou A.A.F.
No entanto, existem casos totalmente inversos desse. Wilson Monteiro é enfermeiro e conseguiu o visto na primeira tentativa, em julho de 2013, no Rio. De acordo com ele, a entrevista durou menos de um minuto e meio. A oficial lhe perguntou para qual cidade dos EUA ele iria; se ele já havia saído do Brasil alguma vez, por quanto tempo e para quê; o que ele fazia no Brasil e quanto ganhava na função que exercia.
“Acredito que, pelo fato de trabalhar para uma empresa estrangeira da área de petróleo, isso me assegurou o visto, mas confesso que fiquei com medo da negativa sem ter a oportunidade de dizer nada, como algumas pessoas diziam; entretanto, a oficial do Consulado que me atendeu foi supereducada", comentou Monteiro.
Para Amanda, não há critérios para a aprovação de visto, porém, existe um perfil de entrevistado que dá mais certo. "A pessoa precisa primeiramente ter vínculos com o Brasil. Ela precisa provar que tem algo que a prenda ao País e que a ida aos EUA será só a passeio, que não tem por que ficar lá. Porém, mesmo se essa pessoa tiver isso e o formulário dela estiver mal preenchido, ela não vai conseguir. Se no momento da entrevista o que a pessoa disser não estiver em sintonia com o que está no formulário, ela não consegue. O Consulado Americano representa outra cultura, então, os critérios que eles utilizam para aprovar um visto ou não são diferentes daqueles que nós, brasileiros, usaríamos", afirmou.
(*) A entrevistada pediu para não ter o nome divulgado.

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