Frederico Haikal/Hoje em Dia
Na entrada e na saída do bairro, o Comando manda seu recado a possíveis criminosos
Com a desativação de uma unidade da Polícia Militar, há sete anos, no
bairro Novo Aarão Reis, região Norte de Belo Horizonte, uma facção
criminosa assumiu o papel do Estado, oferecendo segurança a moradores e
comerciantes, porém, sob uma cartilha própria. Quando o assunto é fazer
justiça, o “Comando”– nome dado à quadrilha, deixa claro que ali,
diferentemente da legislação brasileira, existe a pena capital: “Ladrão
morre”, é o que dizem avisos pichados em muros na entrada e na saída do
bairro.
Os juízes são os “Meninos”, turma que comanda o tráfico de drogas no
local. Alguns moradores dizem apoiar a iniciativa, uma vez que não são
obrigados a pagar pelo serviço de vigilância do espaço. A antiga
companhia da PM foi transferida para um anexo de um posto de combustível
na MG-020.
“Não precisamos de polícia nesse bairro. Aqui podemos dormir com as
portas e janelas abertas”, afirmou uma moradora enquanto fazia compras
em uma loja.
Outra mulher garante que não há crimes nas ruas do Novo Aarão Reis e
que, após o posto policial ser desativado e o imóvel onde eles ficavam
ser destinado para trabalhos sociais desenvolvidos por uma ONG, a paz
voltou a reinar. “Antes, não podíamos sair e deixar nossas casas vazias e
abertas. Hoje não temos esse problema”, explicou.
Um comerciante disse que nunca foi assaltado e que não precisa pagar
nada para ter o direito de ir e vir assegurado nas ruas e becos do
lugar. “Podemos andar despreocupados. Enquanto vários supermercados
estão retirando os caixas eletrônicos, o único que existe aqui nunca foi
arrombado”, destacou.
Outro comerciante confirmou a sensação de segurança do bairro e
garantiu que se houver roubos no local o bandido sequer consegue sair de
lá. “Quando um criminoso de fora, aquele que não conhece as regras,
apronta, ele é capturado de imediato. Há apenas uma entrada e uma saída
aqui, o que reforça a nossa segurança”, observou, destacando que se a
reportagem ficasse por lá, poderia ver como o local é tranquilo sem a
presença do Estado.
Cabeleireiro é morto por encapuzados
O assassinato do cabeleireiro Leandro Xavier Rocha, de 30 anos, na
porta de casa, no Novo Aarão Reis, pode ser um dos casos de execução
praticados pelo “Comando”.
Segundo testemunhas, dois homens encapuzados invadiram a casa, renderam
a vítima e dispararam sem dar-lhe chance de sobrevivência: foram dois
tiros na cabeça e outro no pescoço. Moradores do Novo Aarão Reis
acreditam que, pela forma característica da execução, o cabeleireiro
tenha ferido o “código penal” local.
O comando do 16º Batalhão da PM, que faz o policiamento no bairro, não
se manifestou sobre o caso. O tenente-coronel Alberto Luiz Alves, chefe
da comunicação da corporação, ressaltou que a polícia é quem deve ocupar
o bairro. “Vamos tomar providências. Não podemos deixar que esta moda
pegue em Belo Horizonte”.
Pesquisador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública
da UFMG (Crisp), Bráulio Figueiredo Alves da Silva teme que a ação de
grupos criminosos organizados, fenômeno comum no Rio de Janeiro,
torne-se rotina em BH caso providências não sejam tomadas. “A polícia
tem como função prevenir e atuar em todos os bairros. Se isso não
acontece, os bandidos podem demarcar territórios”.
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