domingo, 2 de setembro de 2012

Eleitor dá a maior bandeira » População de cidade do Norte de Minas não se intimida e declara seu voto

Luiz Ribeiro
Simone Lima -Estado de Minas
Publicação: 02/09/2012 07:40 Atualização:
Ao entrar em Mirabela, a 483 quilômetros de Belo Horizonte, no Norte de Minas, o visitante mais desavisado nota algo inusitado na paisagem da cidade, de 12,8 mil habitantes. Por todo lado, bandeiras azuis e vermelhas – que nada têm a ver com times de futebol – dão tom à disputa pela prefeitura, travada entre dois candidatos. Nas casas onde tremula a bandeira azul, com o número 11, é sinal de que quem mora ali é eleitor de Jorge Veloso Pinto (PP), o Jorge da Emater. As vermelhas, com o número 40, são uma declaração de que o morador do domicílio votará no ex-prefeito Carlúcio Mendes Leite (PSB), o Carlucinho.
O cenário é no mínimo curioso, afinal são centenas de bandeiras logo à primeira vista. A mistura de cores também é evidente, o que torna difícil identificar qual é o candidato mais forte. Em muitos pontos da cidade, bandeiras rivais são expostas lado a lado, sem que isso cause algum tipo de provocação entre os vizinhos, que convivem na mais pura harmonia.
A “disputa das bandeiras” na cidade do Norte de Minas é uma consequência das mudanças na forma de fazer campanha no interior, impostas pela legislação eleitoral. Antigamente, os candidatos dos pequenos municípios promoviam grandes reuniões –os comícios –, nas quais, como estratégias para atrair público, ofereciam comida, bebida e café com biscoito. Depois, vieram os showmícios, com apresentação de cantores – incluindo nomes até de projeção nacional – depois dos discursos políticos. Também existia a distribuição de camisetas, bonés e outros brindes com o nome e os números dos candidatos.

Todas essas práticas, no entanto, estão proibidas desde 2006, com a Lei 11.300/2006, que ampliou as restrições da Lei 9.504/1997, que, por sua vez, disciplina a propaganda eleitoral. Em Mirabela, a campanha ficou ainda mais restrita com a proibição da pintura dos nomes dos candidatos em muros, vedada desde 2008. Assim, as bandeiras surgiram como uma estratégia de divulgação dos candidatos e uma forma de estabelecer uma fidelidade dos eleitores. Elas são erguidas em mastros feitos de varas de bambu, fincadas nos quintais das casas. Algumas estão em meio à copa das árvores, mas há também aquelas que ultrapassam sete metros de altura. Também são vistas em cima das lajes e telhados, disputando espaço com antenas parabólicas.
Os candidatos admitem que as bandeiras substituem os antigos métodos de propaganda política, mas alegam que a ideia partiu dos próprios eleitores. “Antes, eles pintavam os muros de suas casas com a propaganda dos candidatos que apoiavam. Mas, desde a campanha passada (2008), a pintura foi proibida por lei municipal. Por isso, alguns resolveram erguer bandeiras com os seus candidatos preferidos. Aí a moda pegou”, informa o ex-prefeito Carlúcio Mendes Leite, que já administrou a cidade por três mandatos. Para Carlucinho, que concorre pela oposição, é uma maneira democrática de o eleitor se manifestar. Ele admite, no entanto, que pessoas de sua campanha também colocam as bandeiras nos quintais das casas, “praticamente sem nenhum custo”. “Mas é o pessoal, por livre e espontânea vontade, que pede”, afirma. O candidato não arrisca dizer quantas bandeiras vermelhas estão espalhadas pela cidade. “Mas são muitas”, diz.
Gastos reduzidos
Satisfeito com a divulgação da sua candidatura pelas bandeiras azuis, Jorge da Emater, que tem o apoio do atual prefeito, Lacerdino Garcia Menezes (PDT), garante que não gasta dinheiro com esse tipo de propaganda e reforça que a ideia surgiu exclusivamente dos eleitores. “É uma forma democrática que as pessoas encontraram para manifestar o apoio aos seus candidatos”, diz Jorge. Ele revela que, como as bandeiras ajudam a divulgar o seu nome e o seu número na urna eletrônica, a campanha fica até mais barata. Jorge conta que eleitores do distrito de Muquem e dos povoados de São Bento e Riacho das Pedras também adotaram a forma de apoio aos seus candidatos. O candidato do PP também prefere não apostar em um placar. “Só sei que tem muitas famílias aderindo à nossa candidatura”, resumiu.
A doméstica Maria de Lourdes Gonçalves é uma das moradoras de Mirabela que “marcaram território” com uma bandeira azul numa parede, no segundo pavimento casa ainda em construção, para revelar que apoia Jorge da Emater. “Antigamente, a gente pintava os muros, mas proibiram esse tipo de propaganda e agora usamos a bandeira”, observa. No telhado da casa ao lado tremula uma bandeira vermelha, com o 40 do candidato Carlucinho. Ali mora o ajudante de pedreiro Cleidson Silva, que confessa conviver em perfeita harmonia com os vizinhos, apesar de estarem de lados opostos na campanha eleitoral. “Acho que colocar bandeira é uma forma de manifestar nossa opção e de fazer propaganda sem nenhum tipo de poluição. Pelo contrário, a cidade fica enfeitada”, diz Cleidson.
Também existem moradores que preferem a neutralidade e não quiseram usar a bandeira, para não declarar o voto. “Tenho o meu candidato, mas prefiro não me manifestar porque trabalho na prefeitura e depois poderei ter algum problema”, justificou o eleitor Edson Fernandes Rocha. Ele ficou receoso até mesmo de tirar foto.
Tradição ameaçada
Conhecida desde 1997 por “enfeitar” a cidade com bandeiras vermelhas e amarelas na época de campanha eleitoral, Pedra do Indaiá, no Centro-Oeste de Minas, assiste a uma briga entre candidatos a prefeito que ameaçam essa tradição criada pelos próprios eleitores. Isso porque, este ano, o ex-prefeito e candidato pelo PR, Itamar José da Costa – que seria representado pela bandeira amarela –, decidiu pedir o fim dessa prática na cidade.
Costa colocou até carro de som pedindo que os eleitores não colocassem as bandeiras amarelas nas suas casas. Ele explica que quer manter uma campanha “limpa” na cidade e afirma que a tradição acaba poluindo visualmente o município. “Essa iniciativa parte dos eleitores. Mas acho essa uma tradição horrível. Primeiro porque polui a cidade visualmente e segundo porque acaba causando briga. O voto deixa de ser secreto, porque a pessoa toma partido do candidato ao colocar essa bandeira. Isso gera discussão e até briga entre vizinhos”, acredita.
O atual prefeito e candidato à reeleição, Cláudio Gonçalves Coelho (PTB), não concorda. Segundo o advogado da campanha, Antenógenes Antônio da Silva Júnior, os dois candidatos haviam feito um acordo para limitar o número de bandeiras nesta eleição: cada coligação teria direito a até mil bandeiras. “Antigamente, cada um colocava quantas quisesse. Limitando esse número, a cidade não fica carregada visualmente”, afirma Silva Júnior. O advogado destaca que algumas bandeiras vermelhas já foram colocadas. “É algo que parte dos eleitores, que, com certeza, acaba ajudando na propaganda do candidato”, ressalta.
Para o comerciante Erildo Ribeiro Santos, as bandeiras são uma tradição e nunca foram motivo de briga entre os eleitores. “Eu faço isso toda eleição. Agora, querem acabar com essa cultura na cidade, porque estão com medo de perder. Essa é minha opinião”, diz.
O aposentado José Divino dos Santos também fez questão de colocar a bandeira vermelha no muro de sua casa. “Faço isso há muitos anos. Todo mundo coloca e a gente acaba colocando também. É um costume. Não tem nada de briga entre eleitores e de poluir a cidade visualmente. O povo coloca porque quer”, declara.
Mais discreta, Aparecida da Costa prefere não opinar e não coloca nenhuma bandeira em sua casa. “Nunca coloquei e nem pretendo. A cidade não fica bonita, e na minha opinião, o voto tem que ser secreto”, conta. O Cartório Eleitoral informou que nada impede que os dois candidatos utilizem bandeiras durante as campanhas.

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