Está rolando uma história interessante na internet e logo mais vai bombar nas redes sociais. É o seguinte:
Marte sempre atiçou o imaginário das pessoas, desde o século 19, pelo
menos. Os mapas de Giovanni Schiaparelli feitos durante a “grande
oposição” de Marte em 1877 retratavam “mares”, “continentes” e “canais”.
Os mares e continentes simplesmente refletiam padrões claros/escuros da
geologia do planeta, já os canais nada mais eram que ilusões de óptica,
como foi provado posteriormente. Só que a tradução para o inglês foi
feita de maneira errada, dando a ideia de que seriam canais artificiais e
não a intenção de Schiaparelli de serem leitos de rios secos.
Depois, Percival Lowell repercutiu essa ideia como novos mapas,
afirmando que os canais eram construções de uma civilização inteligente
que conduzia água dos polos para os equador. Os claros/escuros da
superfície marciana seriam na verdade regiões desérticas e florestas,
respectivamente. Eu tive a oportunidade de segurar um catálogo com esses
mapas pintados à mão. São obras impressionantes de bonitas.
Mesmo com a Mariner 4 mostrando nos anos 1960 que não há canal algum
(no sentido de obras de irrigação) a ideia de que havia vida inteligente
em Marte nunca deixou de ser popular. Basta lembrar das inúmeras obras
com esse tema, a começar pelo livro “Guerra dos Mundos” de H.G. Wells,
que virou um programa de rádio e dois filmes, que eu saiba.
Tirando essa parte da ficção, Marte parece ser mesmo o lugar no nosso
Sistema Solar mais promissor para abrigar (ou ter abrigado) vida.
Evidências de água no passado, de água no subsolo, atmosfera tênue,
temperaturas que podem chegar a valores positivos algumas vezes, enfim,
condições favoráveis ao desenvolvimento de vida já foram encontradas.
Começando com as sondas Viking, que pousaram na superfície de Marte
na década de 1970, volta e meia as sondas que lá pousam carregam algum
tipo de experimento com o objetivo de investigar a possibilidade de
haver ou ter havido vida. Os experimentos da Viking mostraram resultados
inconclusivos, as evidências obtidas poderiam ter origem biológica, mas
também poderiam ser resultado de reações puramente químicas. Mais
recentemente, um experimento na Mars Polar Lander também falhou por
conta de reações químicas imprevistas com uma amostra de solo aquecida.
Agora é a vez do Curiosity, um jipe robô de quase uma tonelada e
movido a energia nuclear em atividade em Marte. O Curiosity é um
verdadeiro laboratório sobre rodas, carregando 11 instrumentos, entre
sensores, espectrômetros e câmeras. Claro, entre seus objetivos está
pesquisar a chance de haver, ou ter havido vida no planeta.
O que está rolando nos sites de notícias é uma especulação de que a
Nasa teria resultados bombásticos para revelar e estaria mantendo
segredo. Essas especulações ganharam força depois de uma entrevista em
uma rádio nos EUA do investigador principal da missão, John Grotzinger.
Ele disse literalmente e ao vivo que “enquanto nós estamos aqui sentados
e conversando, o SAM está coletando dados e eles parecem realmente
interessantes.” O SAM é o analisador de amostras em Marte, um
instrumento com um vasto leque de ferramentas para vaporizar amostras de
solo e rochas, analisando a abundância de elementos químicos leves,
como carbono, oxigênio e nitrogênio, comumente associados à vida.
Ninguém do time de pesquisadores do Curiosity está autorizado a falar
qualquer coisa. A cautela tem razão de ser: qualquer resultado
científico só pode ser ser divulgado após todos os esforços e testes
para confirmar sua veracidade, ainda mais em se tratando de Marte.
Erros já aconteceram antes. Em 1996, um meteorito de origem marciana
que parecia mostrar vestígio de vida acabou sendo contestado, pois a
divugação dos fatos foi feita prematuramente, antes de uma revisão por
outros pesquisadores. Os neutrinos mais rápidos que a luz são outro caso
de precipitação. Mesmo o Curiosity já sofreu com isso: a análise de uma
amostra de atmosfera marciana mostrou a presença de gás metano. Esse
gás é produzido por bactérias e é um dos possíveis indicadores da
presença de vida, mas a possibilidade de ter havido contaminação do
instrumento com uma amostra de ar da Flórida, local de lançamento do
Curiosity não podia ser descartada. Ressabiado, o time de pesquisadores
resolveu realizar uma nova medição e, nela, o metano não deu as caras.
Grotzinger, nessa mesma entrevista, disse que toda a equipe estava
“mastigando” os dados para ter certeza dos resultados, mas que eles
iriam entrar para os “livros de história”. Mas o que poderia ser? Não dá
para ter certeza, ninguém fala nada mais a respeito e enquanto não há
uma palavra oficial, o que pode ser feito é especular.
Um resultado digno de entrar para os livros, como disse Grotzinger,
seria a detecção de vida. Mas isso é improvável, até mesmo pelo próprio
instrumento, que tem por objetivo fazer análises químicas e não
biológicas. Mas a detecção de simples moléculas orgânicas seria notável,
apesar de ser mais ou menos esperado. Nesse caso, bastaria água, que
havia em Marte no passado, para que as chances de ter havido condições
para que a vida surgisse fossem bem grandes.
Entretanto, se o SAM encontrar indícios de moléculas orgânicas
complexas, estaremos vivenciando um momento histórico. Moléculas assim
são esperadas como resquícios de atividade de formas de vida mais
complexas. As chances disso acontecer em uma amostra de solo escolhida
aleatoriamente são muito pequenas, mas como a especulação está liberada,
por que não?
Os resultados, mantidos em segredo por enquanto, devem ser anunciados
em breve na reunião anual da União Geofísica Americana, que acontece em
San Francisco entre 3 e 7 de dezembro. Se não vazar alguma coisa antes
disso, muita especulação vai rolar por aí até o evento. Também não
acredito que iam fazer tanto alarde para pouca coisa. Só nos resta
aguardar!
Fonte: http://g1.globo.com/platb/observatoriog1/
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