Brasil
Parcela da classe C teve crédito farto, comprou muito e agora não está conseguindo honrar dívidas
Escolha. Com multiprestações de computador, celular e
TV, Edivânio Fernandes decidiu frear todos os gastos e adiou o sonho da
moto
PUBLICADO EM 21/07/14 - 03h00
Futebol, novela e política sempre estarão
presentes em um salão de beleza. No Branca de Neve, no morro do
Papagaio, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, pelo menos mais dois
assuntos já se tornaram frequentes: inflação e juros. O dono, Alexandre
Souza, está acostumado a ouvir os casos de quem se endividou, mas também
tem sua própria história para contar. Com crédito facilitado, financiou
televisão e eletrodomésticos. Conseguiu 100% de financiamento de um
carro em 60 meses e, 36 parcelas depois, não conseguiu mais pagar os
juros. Resultado: o carro foi tomado pela Justiça.
Souza está entre os 13 milhões de moradores
dos morros do Brasil que, juntos, têm um potencial de consumo de R$ 63
bilhões, segundo o instituto de pesquisas Data Favela. Mas, com tantas
prestações e com a inflação sem sinais de trégua, não estão mais
dispostos a gastar como antes e já começam a mudar os hábitos de
consumo.
“O que temos visto é que as pessoas estão
segurando mais os gastos, e isso está totalmente atrelado à alta da
inflação. A população de baixa renda é a mais afetada porque o aumento
dos alimentos pesa mais. E não há uma perspectiva de melhora na renda,
como víamos antes. Isso faz pensar mais antes de comprar”, afirma o
fundador do Data Favela, Renato Meirelles.
Souza sabe exatamente o que é mudar hábitos.
“Tive que cortar bastante coisa. Parei a reforma da minha casa, e a do
meu salão ficou para depois”, afirma. Ele conta que as prestações se
misturaram e não conseguiu mais pagar o carro, que era R$ 734 por mês.
“Procurei um advogado para me ajudar a negociar uma redução nos juros,
ele me aconselhou a não pagar mais, e eu perdi o carro”, relata. “Agora,
eu perdi meu nome limpo e não tenho mais crédito”, afirma ele.
O microempresário Edivânio Fernandes também
teve que fazer escolhas. No cartão de crédito, ele está na quinta das 12
prestações da TV, na segunda das 12 parcelas do computador e na última
da décima prestação do celular. “Eu financiei um carro e fiz consórcio
de uma moto. Para não ficar muito apertado, em vez de tirar a moto,
quitei o carro com o dinheiro do consórcio”, conta.
O coordenador do curso de gestão de negócios
em comércio da Faculdade IBS da Fundação Getúlio Vargas, Fernando
Roberto Marchesini, afirma que, pelo menos nos próximos 12 meses, essas
pessoas vão parar de comprar. “Elas não tinham acesso a crédito para
comprar produtos como TV de LCD, endividaram-se e vão frear o consumo,
mas o governo fará novas políticas para reduzir o preço e, dentro de um
ou dois anos, eles voltarão a comprar”, diz.
Inflação
IPCA. A inflação do primeiro semestre deste ano acumula alta
de 3,75%. No ano passado, no mesmo período, era 3,15%. E, em 2012, o
índice era de 2,32%.
Nenhum comentário:
Postar um comentário