sexta-feira, 25 de julho de 2014

Quer saber por que Israel responde ao Ministro das Relações Exteriores Luiz Alberto Figueiredo com ironias? Basta olhar pra trás.



Primeiro, o Brasil tem estreitado relações com os inimigos de Israel. Firmou acordos com o então presidente do Irã, Mahmmoud Ahmadinejad, que disse que o "Holocausto nunca existiu". Como se sabe, a teocracia iraniana quer desenvolver uma bomba-atômica para, quiçá, explodi-la em Tel Aviv. Igualmente com a Turquia do premier Tayyip Erdogan, alvo de vários protestos em decorrência da islamização que tem promovido no estado turco e que esses dias afirmou que "Israel ultrapassou Hitler em barbárie". A Síria, que vive uma guerra civil já há alguns anos, contou com o apoio brasileiro no Conselho de Segurança da ONU na votação da imposição de sanções ao regime de Bashar al-Assad, ditador que, sem nenhuma preocupação com as leis de guerra e com os espólios de cadáveres civis, usou armas químicas contra seus inimigos fundamentalistas.
Segundo, o Brasil, assim como não condena e combate grupos terroristas na América Latina (vide FARC), não repudia grupos do Oriente Médio que recorrem ao terrorismo, como o Hamas e o Hezbollah.
Terceiro, o Brasil acusa Israel de tomar propriedades e territórios de palestinos, principalmente na Cisjordânia. Mas há poucos meses a Rússia tomou a Crimeia da Ucrânia, que depusera Viktor Yanukovych. E desde então, Putin tem armado os separatistas daquele país, que, tudo leva a crer, semana passada abateram um Boeing com 300 civis a bordo. E o Brasil tem apoiado a Rússia em sua sanha imperialista e intervencionista, repudiando as sanções econômicas que os EUA e, em menor grau, a UE têm-lhe imposto. Cadê a coerência?
Quarto, o Brasil acusa Israel de usar força desproporcional em Gaza - e, sim, é de se questionar os meios empregados para combater o Hamas. Toda a comunidade internacional tem se preocupado com a escalada do conflito. manifestando-se contra o exagero da força e exigindo o cessar-fogo, que o Hamas não aceita. Ocorre que o Brasil tem se aproximado de ditadores africanos que, não raro, em uma semana tiram o número de vidas que Israel já tirou desde sua criação, em 1948.
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, ditador da Guiné Equatorial há mais de 30 anos; Paul Biya, ditador de Camarões há 32 anos; Denis Sassou-Nguesso, desde 1997 no poder no Congo; José Eduardo dos Santos, ditador em Angola há 35 anos; Robert Mugabe, com amplos poderes no Zimbábue desde 1986; o finado lunático Muammar Gaddafi, ditador líbio por nada menos que 42 anos, são alguns dos casos de estreitamento de relações e acordos políticos e econômicos. Talvez o pior seja Omar al-Bashir, 10 bilhões de dólares em paraísos fiscais, vários mandados de prisão, inclusive do Tribunal Penal Internacional, pelos crimes contra a humanidade que cometeu em Darfur, no Sudão, genocídio que matou entre 200.000 e 400.000 vidas. Ao perdoar dívidas desses países, o governo brasileiro contribui de forma direta à perpetuação desses ditadores no poder, e de forma indireta à continuidade de crimes e extermínios que fazem a invasão de Gaza por Israel parecer louvável.
O mesmo se aplica aqui na América Latina: Israel vê o Brasil financiando assassinos como Fidel Castro; emitindo nota de apoio à proto-ditadura de Nicolás Maduro, que matou pelo menos 40 manifestantes e ainda mantém preso ilegalmente o líder de oposição Leopoldo Lopez; dando asilo em sua embaixada ao golpista de Honduras Manuel Zelaya e logo depois suspendendo o Paraguai do Mercosul para incluir a Venezuela no bloco, usando como subterfúgio um processo de impeachment totalmente probo e lícito contra o ex-presidente Fernando Lugo.
Correligionários do partido à frente do governo e seus aliados políticos apoiam ninguém menos que Kim Jong-Un, que no século XXI mantém na Coreia do Norte campos de concentração nos quais centenas de milhares de pessoas são escravizadas. E em pleno Congresso, Israel vê parlamentares com cartazes acusando o Estado judeu de cometer um genocídio em Gaza.
Ora, Israel - há quase 60 anos sob ataques de inimigos em todas as suas fronteiras - vê o Brasil dando apoio a toda essa gente ruim e vai ouvir calado os repúdios do Itamaraty às suas estratégias de defesa? Claro que não.
Isso não é brincadeira. Não se instrumentaliza a chancelaria do País para afagar quem você gosta e atacar quem não gosta. Estados são permanentes. Governos são provisórios, embora o nosso, como se vê, prefira aqueles que pretendem se manter no poder "ad aeternum". O que o governo faz hoje reflete lá na frente, daqui a 20, 30 anos. O Brasil precisa de uma política externa de Estado, coerente, comprometida com os direitos humanos e, principalmente, que respeite os princípios constitucionais que regem as relações internacionais, os quais têm sido sistematicamente violados pelo atual governo. Simplesmente não se acusa um Estado de cometer genocídio - crime do qual o povo do próprio acusado foi uma das maiores vítimas na história - sem sofrer retaliação. Não existe diplomacia séria sem medir as palavras, os atos e suas consequências.
Convocar o embaixador brasileiro para consultas não só não contribui com absolutamente nada, como estremece as relações, mina o diálogo entre os países e o nosso poder de voz, e ainda dá ao Hamas fôlego para continuar atacando Israel, usando crianças como escudos e recrutando civis para o cometer atos terroristas.
Pelo menos o Brasil agiu corretamente ao recuar após as ironias do porta-voz do ministério de Relações Exteriores de Israel. Essas rusgas diplomáticas, nesse caso, não devem comprometer as relações bilaterais entre os países. Se o Brasil quer ser ouvido e exercer alguma influência no conflito - e hoje, para Israel, nossa opinião é mesmo irrelevante - deve buscar a conciliação.

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