segunda-feira, 15 de junho de 2015

1997: Memórias do movimento por Cel Alberto Luiz



Em 1997, Capitão Alberto Luiz e Cabo Júlio
Amigos, permitam-me mencionar, sem apego a nada, sinto profundamente a tristeza, por um lado de ter feito parte deste momento. Uma, por que, sinceramente, não queria que nada daquilo tivesse acontecido. Era Assessor de Comunicação do Comando de Policiamento da Capital. Daí participei de todas as tratativas do Alto Comando com Secretário dos senhores oficiais superiores. A duas, que sempre que podia pedia, no limite de minha competência, que os senhores Coronéis não aceitassem o aumento diferenciado. O percentual de 10 por cento para os oficiais e nada para os praças. Sequer fui ouvido. 
Assessorei ao senhor Coronel Guilherme, meu amigo, quem me considerava muito. O único oficial superior, nessa polícia que me respeitou, como homem e como profissional. Nunca fui puxa saco de ninguém. O implorei para que na Companhia do canil não falasse o que falou. Mas, não fui atendido. 
Nas reuniões seguintes, confesso-lhes que pedi a ele e ao Chefe do Estado Maior, eu sendo apenas Capitão, que assumissem a tropa. Mas, fui repreendido. Procurei, por iniciativa, aos atuais deputados Cabo Júlio e Sgt Rodrigues, naquela oportunidade, eles estavam no COPOM, implorei a intervenção deles na reunião que aconteceria no Clube dos Cabos e Soldados, no bairro Gameleira, que pudessem, logo depois, pedir a todos que fossem para casa e que mão viessem para a Praça da Liberdade. 
Minha preocupação era que pudesse ter a infiltração de policiais civis armados e causassem algum tumulto. Haja vista que, mesmo sendo apenas um Capitão, solicitei aos Senhores Coroneis e Ten Coroneis para não cercarem o QCG (Quartel do Comando Geral) com cadetes, pois, poderia dá problemas. Só Deus é minha testemunha. 
O atual Deputado Cb Júlio, naquela, oportunidade, disse-me sonoramente que "o bicho" tem que pegar Capitão, não vai dá! Já os senhores Coronéis disseram-me: "Alberto, você não enxerga um palmo na frente do seu nariz". A partir daquele momento fui proibido de falar com a imprensa. 
Aconteceu a reunião na Gameleira e os policias PM unidos com policiais civis caminharam. Pararam na Praça Sete, onde, o Cabo Júlio discursou. Seguiram, então, para o QCG. Lá, encontraram uma linha de cadetes (masculinos e femininos). Esses foram atropelados e as cadetes femininos constrangidas com afagos ao serem agarradas. Os policiais avançaram.
Eu, ao lado do Coronel Eleutério e Antônio Luiz vimos os policiais fardados e em trajes civis avançarem. Confesso corri para a portaria principal do QCG. Quando vi o Cabo Valério sobre o patamar mais alto do Hall da escadaria do QCG pedindo calma aos companheiros, quando houve um disparo. Para nossa tristeza, ele foi atingido. 
Vi o momento, quando ele foi carregado e passou por mim desfalecido, sendo levado pelo Coronel Antônio Luiz, Cmt do 1 BPM e outros. Triste cena. Fui para o segundo andar do QCG. Lá, dentro, todos estavam em pânico. Policiais Femininos do COPOM em pranto de choro. Oficiais retiram suas passadeiras. Um corre, corre. Alguns rastejando. Cena patética. O Ten Cel Rúbio aos gritos pedindo que fosse tomada uma atitude para que não houve mais mortes. 
Mas, era uma voz solitária ouvida nos corredores. Não acreditava está vivendo aquilo. Primeiro, preocupei-me com as Policiais Femininos, levando-as, o maior número possível, para a garagem, para que elas pudessem sair do Prédio em segurança. Voltei e encontrei-me com o então, Capitão Mendonça, sem passadeira. Pensei ser o único que tivesse medo de morrer, mas, na hora "h". Todos são iguais. Pensei! 
E o Cabo Valério, baleado, meu amigo. Militar que trabalhei com ele no 13º BPM. Quem ajudou-me, muito, no início de minha carreira como praça, na PM. Ele estava no HPS. Pensei então na sua família. Então, fui até, o 5 andar. E entrei na Sala do Comandante Geral, que estava com o Chefe do Estado Maior. Sendo o CG o senhor Cel Antônio Carlos e o CHEM, o Cel Miranda, tendo em vista que o Cel Herbert tinha deixado a Chefia do EM, dias antes do movimento. Talvez, prevendo que o pior pudesse acontecer. O meu objetivo, ao entrar na sala do Comandante Geral, foi solicitar-lhe que concedesse-me um motorista e uma viatura para ficar à disposição da família do Cabo Valério, no HPS. Depois de ser "xingado", foi me autorizado e visto que era importante. 
Fiquei 04 (quatro) dias no HPS, sem ir em casa. Atendendo a família do Cabo Valério. Principalmente, sua esposa e filhos. Ademais, atendia aos irmãos. Tive a iniciativa, mediante, autorização do Comandante Geral de abrir uma conta no Banco Bemge, produzir e remeter uma mensagem para toda a PM, para que os companheiros, pudessem depositar alguma ajuda. Naquela, época a mensagem era pelo "POST" o sistema de comunicação existente. Apesar de outros afixarem uma mensagem em alguma agências, dizendo ter sido eles. 
Amém! O objetivo era ajudar a esposa e a família. Quando, no quarto dia, estando no CTI, o Valério transcedeu. Nesse dia recebi o Cabo Júlio, que portava uma Bíblia, debaixo do braço. Momento em que eu dirigir-me a ele, dizendo-lhe. O "bicho pegou", como você havia dito-me. Como fica, agora uma esposa sem marido e filhos sem um pai? Nada me foi dito. A imprensa registrou nosso encontro no HPS. Pedi licença, ai dizer-lhe, agora, não é necessário mais sua visita, não. Ele acaba de falecer. Disse-lhe, conceda-me, sua licença, pois, escoltaria o corpo do nosso "heroi" até o IML. 
No IML tive que contornar outra situação, quando oficiais e praças, não queria que o corpo fosse necropsiado. Após entenderem. Fui providenciar um túmulo, no cemitério da Colina. Onde comprei, em caráter emergencial, um túmulo e providenciei a preparação do Corpo e o féretro (caixão), junto a Pax de Minas. Por volta das 05h da manhã, já exaurido, sem dormir direito à 04(quatro) dias e, sequer, sem alimentar adequadamente, entreguei o corpo do Cabo Valério, no velório do Cemitério Parque da Colina, ao novo comandante do BPChoque, Ten Cel Aquilar. Não acabou. Houve novos fatos e desdobramentos. Fica para a próxima. Que a história nos ensine alguma coisa. E que Deus esteja sempre no controle e abra os nossos olhos. Fiquem com o Senhor!

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Alberto Luiz  é Coronel da reserva da PMMG, ex-assessor de Comunicação da corporação, integrante e colunista da mídia Plantão Policial MG.
* Os artigos assinados pelos colunistas são de inteira responsabilidade dos autores e não reflete, necessariamente, a opinião do jornal. O Plantão Policial MG, democraticamente, abre esse espaço para que os colunistas tenham total liberdade para exporem suas opiniões nos textos sem nenhum tipo de censura. Os textos são pessoais e cada colunista escolhe o assunto que achar interessante, sendo responsável por eles. 

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