Victor Augusto Frutuoso Figueiredo, é agente de Polícia Federal, atua
há 17 anos na instituição, mas tem 24 anos dedicados à atuação na
segurança pública, uma vez que antes de assumir o atual cargo, havia
desempenhado o papel de policial civil, como papiloscopista, no Rio de
Janeiro. Victor, que é também professor por formação, deve se aposentar
pela PF em aproximadamente dois anos. Em entrevista ao Jornal do Povo,
Figueiredo falou da atual situação da Polícia Federal em Três Lagoas,
assim como em todo o Brasil, e os motivos que levaram a classe a
iniciar, ontem, uma paralisação nacional.
Jornal do Povo – A Polícia Federal de todo o Brasil está mobilizada para uma greve. Quais são as lutas da categoria?
Jornal do Povo – A Polícia Federal de todo o Brasil está mobilizada para uma greve. Quais são as lutas da categoria?
Victor Figueiredo – São basicamente as mesmas da nossa greve de 2012,
quando ficamos parados 72 dias. De lá para cá pouca coisa mudou, pelo
contrário, o quadro vem se agravando. Então, envolve questão salarial,
já que estamos há 7 anos sem nenhum tipo de reajuste ou reparação que
seja. E uma questão que tem sido bastante importante, na qual o governo
federal tem sido bastante insensível, é a adequação das necessidades dos
nossos serviços, das nossas atribuições como policiais. Essa legislação
é antiga, as atribuições da Polícia Federal mudaram e isso não foi
adequado.
JP – Como está sendo desenvolvida esta mobilização?
Victor – Estamos paralisados, de forma parcial, nesta terça e
quarta-feira e, nossa concentração é na praça do Jardim Alvorada, em
frente à Delegacia da Polícia Federal. Contamos com o apoio da população
e também da imprensa para explicar os motivos desse movimento grevista.
JP – Você disse que em 2012 houve uma paralisação da PF e pouca coisa
mudou. Não houve acordo entre a categoria e o Governo Federal?
Victor – Não foi feito acordo. O governo não sinalizou com algo, além
do que já é legalmente previsto. Existe uma previsão legal para que as
perdas salariais sejam recompostas e o próprio cálculo do governo estima
isso em torno de 5% ao ano, para os anos de 2013, 2014 e 2015 e é a
única coisa que ele aceita, que é cumprir a lei.
JP – A paralisação afeta quais serviços em Três Lagoas?
Victor – Basicamente os serviços operacionais. Como em Três Lagoas
existe essa dificuldade de fixação de efetivo, por compor uma equipe de
policiais mais novos, que entraram de três anos para cá, mas que têm
medo de retaliação por não terem estabilidade funcional, que só vem após
três anos, embora esse período seja para avaliar se o policial está
apto ou não para desempenhar a função, os novos agentes têm esse medo.
JP – Fala-se em evasão de agentes da PF. Por quê isso acontece?
Victor – O que acontece hoje, é que o policial federal chega, e por
serem pessoas muito bem qualificadas, porque geralmente são
especialistas em informática, engenharia, química, contabilidade, por
exemplo. Então essas pessoas têm uma expectativa de salário no mercado
de R$ 10.000,00 a R$ 15.000,00, ai eles chegam, encontram um salário de
R$ 7.000,00 e em uma condição de trabalho sucateada.
JP –A categoria cita, principalmente, de sucateamento da Polícia Federal, como um todo. De que forma isso vem ocorrendo?
Victor – Falo disso com total conhecimento de causa, nestes 17 anos
como agente da Polícia Federal. Já trabalhei em uma época que você se
sentia, no dia a dia, prestando um serviço muito relevante para a
população. Você prendia juízes corruptos, deputados, prefeitos,
vereadores, enfim, agentes públicos que estavam lesando o patrimônio do
Estado, estavam sendo alvos das operações da PF, e você via que aquilo
ia gerar um efeito positivo.
JP – Há suspeitas de fraudes nas obras da Copa do Mundo, inclusive envolvendo o Governo federal. Como a PF vê isso?
Victor – Você vê essas notícias hoje em dia, de altíssimos valores
sendo repatriados ao Brasil, da comunidade europeia, Suíça. Tudo faz
parte de inquéritos e operações, não só da Polícia Federal, mas são
inquéritos de 10, 15 anos atrás. Então você vê, estamos num ano de Copa
do Mundo e, eventuais desvios de verbas que estejam acontecendo nas
obras, não apenas agora, mas destes últimos anos, ou seja, a PF está em
uma condição operacional ruim para realizar este trabalho, que geraria
esses frutos daqui 10 ou 15 anos. Então é um questionamento que fazemos
nesta greve, já que, a quem interessa uma PF desmobilizada, porque é o
que vem acontecendo. A gestão de recursos, de pessoal, enfim, a gestão
de um modo geral, no Departamento de Polícia Federal, está muito pior do
que já foi no passado.
JP – Você cita as eventuais fraudes dentro do próprio governo
federal. Isso é algo contraditório, diria, se tratar de uma situação
constrangedora. O eu você falaria sobre isso?
Victor – Temos condições de identificar, exatamente, se e onde, essas
fraudes estejam acontecendo. Essa é a questão que estamos colocando ao
Governo Federal, e o melhor instrumento que ele tem para, se, e em que
extensão isto esteja eventualmente ocorrendo em relação às obras da Copa
do Mundo, que são os agentes da PF, está desmobilizado, e não é de
agora, já vem de cerca de 5 anos para cá.
JP – Como está o efetivo de agentes em Três Lagoas e região, hoje?
Victor – É insuficiente no Brasil inteiro. A Polícia Federal, por
exemplo, atende uma área quase da mesma extensão de um pequeno estado do
Nordeste, vai desde Água Clara, Costa Rica, Bataguassu e Anaurilância,
embora tenha sido tirado a região destes últimos municípios, porque não
íamos para lá. Então pega-se uma área de fronteira com o Estado de São
Paulo e, quando Anaurilândia fazia parte, eram 750 quilômetros de
fronteira com São Paulo, então aí dá para ter uma ideia da área de
cobertura dos agentes que atuam com efetivo reduzido. Posso afirmar que
trabalhamos com quase a metade do efetivo suficiente.
JP – Para atender a demanda de serviços necessários, quantos policiais seriam necessários?
JP – Para atender a demanda de serviços necessários, quantos policiais seriam necessários?
Victor – Em termos nacionais, há uma estimativa de que seriam
necessários cerca de 10 mil agentes de Polícia Federal, uma vez que hoje
estamos com pouco mais de 6 mil, é claro que em Brasília tem uma
concentração maior. Ainda falando sobre a questão salarial, vi nestes 17
anos como agente, centenas de colegas virem para assumir o cargo, mas
irem embora, já que chegam com uma expectativa de trabalho diferente e
vão embora. Em Três Lagoas teve colega que veio, fez outro concurso e
foi embora, ou então que voltaram a atuar na iniciativa privada.
Inclusive teve um que veia da Receita Federal e quando viu como era a
situação, retornou para a Receita, e ainda tem um caso extremo de um
rapaz que acabou pedindo exoneração para voltar para casa e estudar, nem
esperou passar em outro concurso.
JP – Pode-se dizer que a profissão de agente da PF é de ilusão?
Victor – Dá pra dizer isso sim. Tanto que isso se reflete nos
números, que comprovam o que acabei de dizer, uma vez que as pessoas
vem, veem como é e desistem da carreira. Na época em que eu entrei na
carreira, existia um ambiente de trabalho que te motivava a ser melhor, a
trabalhar e a ter incentivo para atuar e qualificar-se e assim promover
um bom trabalho, e hoje quem chega já encontra um ambiente nada
motivacional.
JP – É sabida a insatisfação quanto à diferença salarial entre
agentes da PF e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Como está
esta situação?
Victor – Policiais federais e agentes da Abin tem praticamente a
mesma qualificação e são envolvidos mais ou menos no mesmo tipo de
trabalho, que é a natureza do serviço investigativo e de análise. Há
sete anos eles ganhavam menos do que a gente, e hoje estão ganhando
quase que o dobro. Não que os agentes da Abin não tenham o direito e
mereçam, mas trata-se de atividades muito parecidas, com remunerações
muito diferentes.
JP – Houve concurso público da PF, recentemente. Os aprovados já foram convocados? Isso ajudou na questão do aumento do efetivo?
Victor – O concurso foi em 2012 e a maioria dos agentes ingressou no
início de 2013. Foram aproximadamente 500 agentes que entraram, então
chegamos a 6.400 profissionais, mas esse número foi caindo no decorrer
do ano e em dezembro tínhamos 6.200, ou seja, cerca de 200 já deixaram o
cargo até o fim do ano passado, e outros mais devem ter se afastado e,
posso afirmar que a maioria deles, com menos de três anos de profissão,
pediu exoneração, alguns por terem passado em concursos e assumido
cargos com maiores vantagens ou simplesmente porque não tiveram
motivação para prosseguir.
JP – Como fica a atuação da Polícia Federal durante a Copa do Mundo, diante do número insuficientes de agentes?
Victor – Está acontecendo uma coisa curiosa na Copa do Mundo. A
Polícia Federal está meio que…fazendo um trocadilho infeliz… ela está
sendo colocada de escanteio. Tem atribuições nossas que estão sendo
treinadas pela Polícia Rodoviária Federal e até pela Força Nacional, e
isso demonstra que o Governo está se preparando para depender cada vez
menos da PF, ou seja, qualificando outras forças para assumirem o nosso
papel, no caso de uma greve. O nosso movimento que questiona essa
atitude do Governo em relação a essas comunicações são dados objetivos,
de verba da Polícia Federal que está sendo devolvida, já que a categoria
está sendo utilizada como escape econômico, para gerar superávit
primário. Verba está sendo devolvida para o Governo, porque a gestão não
consegue usar de forma correta. O nosso orçamento caiu e está sendo
aplicado em questões muito pontuais, com uma gestão especificamente
dirigida, de um grupo muito restrito na cúpula da Polícia Federal que
toma essas decisões, que está vendo a coisa diminuir em termos de
prisões. Existem processos no Tribunal de Contas da União em relação a
operações que foram feitas como compra de drones (veículos aéreos não
tripulados), viaturas e material até para a Copa, e isso está sendo
empurrado com a barriga pelo Governo e esse é também um dos
questionamentos que o movimento faz.
Jornal do Povo de Três Lagoas
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